Acervo Levy: a memória musical de São Paulo à disposição de todos

por Camila Fresca 30/10/2020

Há registros preservados sobre a vida musical de São Paulo já nos primeiros séculos da colonização. Os manuscritos musicais mais antigos do Brasil, por exemplo, foram localizados em Mogi das Cruzes e datam de 1710, aproximadamente. No entanto, a atividade musical da região foi bastante acanhada até as últimas décadas do século XIX. 

O dinheiro proveniente das lavouras de café ajudou a mudar essa história. Mas, ao lado da bonança econômica, uma iniciativa cultural foi fundamental para criar um ambiente musical relevante em São Paulo: a Casa Levy, editora de partituras e ponto de comércio de instrumentos musicais fundada em 1860 pelo imigrante francês Henri-Louis Levy. 

Comerciante e clarinetista amador, Levy percorreu o interior paulista vendendo joias ao chegar ao Brasil. Em 1859, decidiu se fixar na capital e dedicar-se a sua atividade preferida. A Casa Levy de Pianos e Música oferecia, além dos instrumentos, serviços de composição, edição e lançamento de músicas, vendidas em partituras. 

[Reprodução]
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Mais do que um simples comércio, ao longo do tempo a Casa se consolidou como um importante polo artístico de uma cidade que não parava de crescer. Henri-Louis Levy tornou-se uma espécie de agitador cultural, promovendo concertos e incentivando a carreira de jovens compositores como Carlos Gomes – de quem foi amigo íntimo – e mais tarde de seus próprios filhos, Luiz e Alexandre Levy.

As atividades da Casa Levy se estenderam por todo o século XX – o comércio existe até hoje, embora não seja mais da família. A grande notícia é que o acervo acumulado ao longo dos anos acaba de ficar disponível online, para consulta gratuita e livre, através do site Acervo Levy

São mais de 1.500 documentos catalogados, inventariados e digitalizados que contam uma história que é ao mesmo tempo familiar e pública, já que através deles é possível recuperar uma parte importante da história da música na cidade de São Paulo.

Há partituras manuscritas e editadas, programas de concerto, correspondências, fotos e documentos comerciais. É possível encontrar, por exemplo, diversas edições do Samba (último movimento da Suíte brasileira para orquestra), de Alexandre Levy, ao mesmo tempo em que se pode saber quanto recebeu o artista que fez a aquarela que estampa a capa de uma das edições, já que o recibo de pagamento foi preservado. 

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A Casa Levy importava e vendia pianos e por meio dos cadernos comerciais ficamos sabendo a quantidade e as marcas do instrumento importadas ano a ano, bem como o número de pianos vendidos e o valor de cada um. Também é possível ter acesso a documentos que contam a criação do Club Haydn, sociedade de concertos fundada em 1883, dirigida por Alexandre Levy e que teve um importante papel na promoção da música de concerto em São Paulo, fomentando o desejo de criação de uma orquestra sinfônica na cidade. Já entre as muitas fotografias, há o registro de um sarau doméstico com Alexandre Levy ao piano e Leopoldo Miguez ao violino.  

Sarau com a participação de Alexandre Levy e Leopoldo Miguez [Acervo Levy]
Sarau com a participação de Alexandre Levy e Leopoldo Miguez [Acervo Levy]

O projeto de tornar público e acessível esse importante acervo é de um dos descendentes de Henri-Louis Levy, o também músico Gabriel Levy. A equipe responsável pela organização e digitalização incluiu os pesquisadores Alexandre Rohl e Felipe Faglioli, com a colaboração de Fernando Binder, do pianista Achille Picchi e do fotógrafo Fanca Cortez.

No final de outubro, uma série de webinários e um concerto on-line marcaram o lançamento do site. As atividades podem ser vistas na página de Facebook do Acervo Levy.  

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