Caruso, Lanza, Corelli, Di Stefano: quatro tenores e centenários

por Redação CONCERTO 09/02/2021

2021 é um ano de efemérides importantes para o canto lírico. Mais especificamente para os tenores. 

Mario Lanza nasceu em 31 de janeiro de 1921; Franco Corelli, no dia 8 de abril; Giuseppe Di Stefano, em 24 de julho, pouco mais de dois meses antes da morte, em agosto, de Enrico Caruso. 

São quatro das principais vozes do século XX – cada uma à sua maneira, marcaram época nos palcos de todo o mundo.

Enrico Caruso (1873-1921)

Durante uma das viagens feitas pelo tenor Enrico Caruso, lembradas no livro Enrico Caruso na América do Sul, de György Miklös Böhm, um jornal argentino definiu a trajetória do tenor. “Caruso é algo mais que um cantor: é um artista de real inteligência, que sabe o que canta”. Mais do que isso: tornou-se uma lenda da história do canto.

Caruso nasceu em Nápoles e, na adolescência, ajudava a família cantando em restaurantes. Aos 18 anos, cantou sua primeira ópera e, em 1900, após uma primeira turnê pela Itália, foi contratado pelo Scala – cantou La bohème, de Puccini, sob regência de Arturo Toscanini, e, um ano depois, participou de um concerto em homenagem a Giuseppe Verdi.

Criou papeis como Loris, na Fedora, de Giordano, e Maurizio, na Adriana Lecouvreur, de Cilea. Em 1903, começou uma longa colaboração com o Metropolitan Opera de Nova York, criando, anos depois, o papel de Dick Johnson, em La fanciulla del West, de Puccini.

 

Em meio a tantos papeis que o colocaram em contato com os grandes nomes da ópera italiana na passagem do século XIX para o século XX, Caruso também entrou para a história como pioneiro no processo de gravação da voz humana. Contratado pela Gramophone Company, ele deixou um conjunto de registros que não apenas revelam os lances do início da indústria fonográfica como a estética do canto de uma época.

Mario Lanza (1921-1959)

A fama mundial que as gravações deram a Caruso o levaram também ao cinema, onde seu principal trabalho foi o filme My Cousin, no qual interpreta a ária Vesti la giubba, de I Pagliacci, de Leoncavallo.

Mas a grande estrela a trafegar entre o universo da ópera e do cinema nas primeiras décadas do século XX foi o tenor Mario Lanza.

Seu nome de batismo era Alfredo Arnold Cocozza. Nasceu em Filadélfia e, aos 16 anos, após cantar em um espetáculo de um teatro local, chamou atenção de um músico da Sinfônica de Boston, que o apresentou ao maestro Sergei Koussevitsky. Do encontro, Lanza saiu com uma bolsa de estudos no Berkshire Music Center em Tanglewood, Massachussets. E, com pouco mais de 20 anos, começava a trilhar um caminho como solista quando foi descoberto por Hollywood. Virou estrela de cinema, daquelas de parar quarteirões – um de seus papeis mais famosos foi justamente o de Caruso em The Great Caruso

 

Com a agenda tomada pelas filmagens, Lanza não gravou óperas completas, apenas trechos célebres e alguns duetos. Os do Otello de Verdi, por exemplo, gravados com dez anos de diferença, mostram a evolução na técnica e na expressividade, com o tenor muito mais atento às enormes capacidades de uma voz abaritonada, quente.

Mas Lanza nunca retornou de fato aos palcos de ópera. E colegas dizem que isso se deveu a uma enorme insegurança, a mesma que o levou ao álcool e a uma rotina autodestrutiva: o tenor morreu com apenas 38 anos, em outubro de 1959, enquanto estava internado em uma clínica para perder peso antes de iniciar as filmagens de um novo filme.

Franco Corelli (1921-2003)

A carreira de Corelli, de certa forma, nasceu de uma aposta. Estudante na Universidade de Bologna, um amigo o desafiou a participar de um concurso de canto. Ele foi, não ganhou, mas ouviu do júri que deveria estudar para se tornar tenor. Ele aceitou o conselho e não demorou muito para ser chamado de “o príncipe dos tenores”.

Bonito, carismático, dono de uma voz potente, com as notas agudas prontas a encantar plateias: além se apresentar em todo o mundo, Corelli foi durante mais de uma década, a partir dos anos 1960, um dos principais tenores do Metropolitan de Nova York. Lá, participou de récitas históricas: sua estreia na companhia em 1961, em um Il Trovatore, de Verdi, se deu na mesma récita em que outra artista fazia sua primeira aparição no teatro - a soprano norte-americana Leontyne Price.

 

O repertório italiano foi a essência de sua carreira, em papeis como Cavaradossi, na Tosca, ou Calaf, em Turandot, duas das óperas de Puccini. Mas ele também se aventurou pelo universo francês, gravando títulos como Romeu e Julieta, de Gounod, e Werther, de Massenet.

Com o tempo, no entanto, Corelli começou a ficar conhecida não apenas pela voz, mas também pelo temperamento difícil, que o colocou em choque com teatros e colegas, entre eles a soprano Birgit Nilsson. E, aos 55 anos, ele se aposentou dos palcos.

“Eu sentia que minha voz estava um pouco cansada, menos brilhante que antes. A vida de cantor me custou muito. Eu estava sempre apreensivo e bravo com todos. Com os nervos sempre à flor da pele, eu já não comia ou dormia”, contou anos depois em uma entrevista ao New York Times.

Giuseppe Di Stefano (1921-2008)

Se o caráter heroico era a marca das interpretações de Corelli, Giuseppe Di Stefano tornou-se um dos maiores tenores italianos pelo canto apaixonado, lírico. Nascido na Sicília, já se sustentava como cantor quando foi convocado para o exército: ele contava que era tão ruim soldado que seu comandante o mandou de volta para casa, para contribuir com seu país como cantor.

A partir do início dos anos 1950, depois de percorrer a Itália, passou a ganhar fama ao atuar regularmente em Nova York e em Londres. E, quando a EMI resolveu iniciar uma série de gravações de óperas completas com Maria Callas, tornou-se o tenor oficial dos registros, desenvolvendo com a soprano uma relação profissional duradoura: nos anos 1970, quando ela retornou brevemente aos palcos para uma turnê de recitais, ele a acompanhou como convidado.

 

Di Stefano também teve vida pessoal atribulada. Aventuras amorosas, como a própria relação com Maria Callas; problemas com álcool, jogos. Rudolf Bing, diretor do Metropolitan Opera nos anos 1970, afirmou que ele poderia ser “tão grande como Caruso se não fosse tão inconsequente".

O próprio tenor falaria sobre o assunto nos anos 1990, em entrevista à revista Opera News. “Eu queria aproveitar a vida, não apenas a ópera. Sim, eu fumava muito. E, sim, eu jogava, ficava acordado até altas horas, dirigia a noite toda. Então, claro, os críticos diziam sempre que eu não estava em forma para cantar”, afirmou, dizendo que os problemas vocais vinham, no entanto, de alergias que ele nunca conseguir curar. 
 

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