Volume 21

por Redação CONCERTO 07/03/2024

Vol 21

CÉSAR GUERRA-PEIXE

1-10 A retirada da laguna (1971)
11 Concertino para violino (1972)
14-17 Museu da Inconfidência (1972)

Orquestra Filarmônica de Goiás
Neil Thomson – regente
Abner Landim – violino

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Texto do encarte do CD

CÉSAR GUERRA-PEIXE (1914–1993)
A retirada da laguna • Concertino para violino e orquestra de câmara • Museu da Inconfidência

César Guerra-Peixe é um dos principais compositores associados ao nacionalismo musical no Brasil. Depois de passar uma década como integrante do movimento Música Viva, fundado por Hans-Joachim Koellreutter, o homem que introduziu o serialismo no Brasil, Guerra-Peixe mudou de direção e passou a focar no nacionalismo na década de 1950, adotando uma linguagem até o fim de sua vida.

As três obras aqui gravadas datam todas da mesma fase da carreira de Guerra-Peixe e estão entre as suas composições mais conhecidas. Encomendada pela Rádio MEC ('Música, Educação, Cultura') e dedicada ao diretor da emissora, Avelino Henrique dos Santos, A retirada da laguna foi escrita em 1971. Foi estreada no ano seguinte pelo A Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo, dirigida pelo compositor, e os mesmos artistas fizeram a primeira gravação completa da obra. A retirada da laguna é uma suíte orquestral programática, inspirada no livro homônimo do romancista, historiador e estadista Visconde Taunay (1843–1899), que descreve um dos momentos mais dramáticos da Guerra do Paraguai (1864–70). A guerra interestadual mais mortal já travada na América Latina, este conflito colocou o Paraguai contra a Tríplice Aliança do Brasil, Argentina e Uruguai. O episódio em questão ocorreu em 1866: após uma expedição mal planejada ao território paraguaio, as tropas brasileiras foram obrigadas a recuar e sofreram muitas baixas. Como oficial do corpo de engenharia do Exército Brasileiro, Taunay participou dessa operação e seu livro foi baseado em anotações que ele fez na época.

Guerra-Peixe reconfigura a narrativa de 21 capítulos de Taunay em nove movimentos, acrescentando um décimo de sua própria inspiração. Eles estão divididos em três seções distintas. O primeiro, composto pelos três primeiros andamentos ("Partir para o Interior"; "Pantanais"; "Alegrar-se em Nioaque"), varia em tom do solene ao festivo, mas tem um carácter predominantemente positivo. De particular interesse é a forma como o compositor evoca a bela paisagem do Pantanal numa longa melodia tocada primeiro pelo fagote solo e depois, com toda a exuberância, pela corda tutti, tudo isso acima do som insistente dos cinco tímpanos. célula batida.

Na segunda seção – movimentos quatro a oito ("Laguna"; "Uma Noite Calma"; "Fogo, depois Tempestade"; "Esperança no Campo das Cruzes"; "A Morte do Guia Lopes") – o conflito propriamente dito se desenrola. Aqui os brasileiros enfrentam seus diversos inimigos: o exército paraguaio, o medo, o fogo, a fome e, o mais letal de tudo, a cólera. As duas cenas de batalha têm um caráter claramente descritivo e contrastam fortemente com o lirismo do quinto movimento. A secção termina com uma comovente evocação da morte de um dos guias que conduziu os soldados através de um território perigoso e é levado por eles para ser enterrado nas suas próprias terras.

A terceira e última seção compreende apenas dois movimentos, começando com 'Peaceful Return'. Assim como Taunay, Guerra-Peixe tenta terminar de forma mais positiva; no entanto, as dissonâncias do quarteto de trompas durante a retirada são uma lembrança de todos os mortos e feridos deixados ao longo do caminho. Talvez por isso o compositor tenha sentido a necessidade de concluir a obra com a lírica e optimista 'Canção à Irmandade Universal', como uma espécie de declaração pacifista no final desta história dos horrores da guerra.

Concertino para violino e orquestra de câmara foi escrito em 1972 e dedicado à Orquestra Armorial de Câmara de Pernambuco e ao seu maestro, o violinista Cussy de Almeida. O Movimento Armorial foi lançado em 1970 pelo escritor Ariano Suassuna, uma das principais figuras literárias do Brasil. Seu objetivo era encorajar a criação de novas obras de arte erudita ou clássica que se inspirassem na cultura popular do Nordeste do Brasil e, portanto, resistissem aos efeitos da cultura produzida em massa. No campo da música, buscou valorizar e ressignificar instrumentos como a viola caipira, o pífano e a rabeca. Guerra-Peixe esteve diretamente envolvido no movimento e algumas de suas obras foram gravadas pelo Quinteto Armorial.

Concertino foi escrito para violino solo e orquestra de câmara composta por duas flautas, uma pequena secção de percussão e cordas. Segundo o compositor, não se tratava de uma obra clássica tradicional nem de um exemplo de música popular ou folclórica, e seu caráter híbrido estava em consonância com a estética proposta por Suassuna e seus seguidores. A escrita do violino solo confere ao instrumento uma sonoridade semelhante à da rabeca. Há ênfase nas cordas soltas, tanto na linha melódica quanto na forma engenhosa como esta é combinada com uma nota de pedal que a acompanha. O movimento central é quase um monólogo para violino, semplice marcado, quase senza vibrato, e a música resultante ecoa o som tranquilo dos aboios, as canções de trabalho associadas à pastorícia do gado. A escrita orquestral também é cuidadosamente concebida para sugerir os timbres e gestos da música folclórica. No terceiro movimento, as flautas introduzem uma espécie de melodia em terças no registro agudo que faz clara referência aos pífanos ouvidos na música nordestina. Quanto à percussão, limita-se ao mundo sonoro da música folclórica, com bombo, bombo lateral, triângulo e pratos, estes últimos especificamente indicados para serem de tamanho médio tipicamente utilizados por bandas de sopro e outros conjuntos tradicionais. A esta lista o compositor acrescenta um par de mineiros, uma espécie de chocalho típico da música folclórica nordestina brasileira, que pode ser substituído por maracás se necessário.

A suíte Museu da Inconfidência também data de 1972. Foi estreada no ano seguinte pela Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, sob a regência de Isaac Karabtchevsky, e tornou-se uma das obras mais admiradas de Guerre-Peixe. A suíte foi inspirada em uma visita que ele fez ao Museu da Inconfidência, em Ouro Preto, em 1966. A Inconfidência Mineira foi um movimento separatista que eclodiu em 1789, na época conhecida como capitania de Minas Gerais. A rebelião planeada foi duramente combatida pelas autoridades portuguesas e o seu líder, Joaquim José da Silva Xavier, 'Tiradentes' ('arrancador de dentes') foi executado em 1792, após o que o seu corpo foi esquartejado. O Museu foi criado em 1944 com o objetivo de servir de local de descanso final para os restos mortais de Tiradentes e seus companheiros conspiradores. Com o tempo, porém, ampliou sua atuação para se tornar a principal instituição dedicada à preservação da cultura mineira do século XVIII.

O primeiro andamento da obra de Guerra-Peixe (Entrada) é uma espécie de passeio, em que os latões parecem evocar a opulência do edifício do museu e a riqueza de histórias que se escondem nas suas paredes. Depois ficamos imersos nos vários mundos representados no museu. Os segundo e quarto movimentos, mais rápidos, retratam o ambiente escravista do século XVIII: Cadeira de Arruar mostra escravos zombando de seus senhores, que não podiam vê-los de dentro das cadeiras e liteiras em que estavam sendo transportados. transportado, enquanto Restos de um reinado negro (`Vestígios de um Reino Negro´) refere-se a elementos da cultura africana trazidos para o Brasil pelos escravos. No final deste movimento, voltamos a ouvir, numa espécie de apoteose, o tema apresentado pelas trombetas na Entrada.

A estrutura da obra como um todo, porém, parece ter sido pensada para enfatizar o poder dramático do terceiro movimento (Panteão dos Inconfidentes - `Panteão dos Separatistas´), o único diretamente relacionado aos acontecimentos da conspiração separatista. Começa em uma atmosfera sombria, gerada por acordes dissonantes nos metais e sopros fortes que contrastam com a sonoridade dos tímpanos e primeiros violinos. Segue-se uma espécie de procissão, em que uma melodia paira sobre a marcha penitente de violoncelos e contrabaixos. A cada repetição da melodia, a música cresce até atingir um clímax em que toda a força dramática da obra se concentra em uma única nota. Uma batida no tan-tan desencadeia uma melodia em terças no registro agudo, sugerindo a canção dos conspiradores. Depois de se manifestarem Tiradentes e seus companheiros, voltamos ao motivo da procissão e, por fim, aos sons abafados dos acordes iniciais.

Juntamente com a Sinfonia nº 2 Brasília de 1960, essas três obras fornecem um panorama significativo da história brasileira na produção de Guerra-Peixe. O movimento separatista mineiro no século XVIII, a Guerra do Paraguai no século XIX, a construção de Brasília e a criação do Movimento Armorial no século XX – todos, à sua maneira, representam momentos-chave no processo de construção de um sentido de identidade nacional, fundamental para o nacionalismo musical que o compositor decidiu abraçar.

Marechal Gaioso Pinto


Orquestra Filarmônica de Goiás
Desde a sua criação em 1980 pelo maestro Braz de Pina Filho, a Orquestra Filarmônica de Goiás tem se comprometido com a democratização da música erudita no estado brasileiro de Goiás, dando especial ênfase à música brasileira em sua programação. Em 2012, a orquestra passou por uma grande reestruturação que marcou o início do seu período mais frutífero e criativo e levou à nomeação, em 2014, de Neil Thomson como Maestro Principal e Diretor Artístico. Sob a liderança de Thomson, a orquestra cresceu rapidamente de um conjunto de importância local para um conjunto de importância nacional.
Hoje amplamente considerada uma das três melhores orquestras do Brasil, a Orquestra Filarmônica de Goiás é conhecida por seu estilo de tocar enérgico e dinâmico e abordagem inovadora à programação. A orquestra fez as estreias sul-americanas de Des canyons aux étoiles de Messiaen, Rituel in memoriam de Bruno Maderna de Boulez e Como una ola de fuerza y ​​luz de Nono. Também está envolvida em um projeto de dez anos para filmar a sinfonia completa de Haydn, `Haydn no Cerrado´.

Neil Thomson
Neil Thomson estudou regência no Royal College of Music com Norman Del Mar e na escola de verão Tanglewood com Leonard Bernstein.
É regente titular e diretor artístico da Orquestra Filarmônica de Goiás desde 2014, levando a orquestra ao destaque nacional com a defesa do repertório brasileiro e contemporâneo. Ele também desfruta de uma movimentada carreira internacional trabalhando com todas as principais orquestras do Reino Unido e a Orquestra Sinfônica Yomiuri Nippon, Orquestra Filarmônica de Tóquio, Orquestra Sinfônica de Tóquio, Orquestra Nacional Russa, Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp), WDR Rundfunkorchester, Orquestra Sinfônica de Lahti e a Orquestra Sinfônica de Lahti. Orquestra Nacional Romena, entre outros.
Já se apresentou com muitos solistas ilustres, incluindo Dame Felicity Lott, Sir Thomas Allen, Sir James Galway, Nelson Freire, Jean Louis Steuerman e Antonio Meneses.
De 1992 a 2006 foi professor de regência no Royal College of Music de Londres, sendo a pessoa mais jovem a ocupar este cargo. Foi nomeado Membro Honorário da RCM em reconhecimento aos seus serviços prestados à instituição.
www.neilwthomson.com

Abner Landim
Natural de São Paulo, Abner Landim iniciou sua formação musical com o pai, o luthier Jayme Landim, estudando posteriormente com Cláudio Cruz, Pablo de León e Chaim Taub. Graduou-se pela Escola de Música Buchmann-Mehta (BMSM) da Universidade de Tel Aviv, recebendo o diploma de honra ao mérito concedido aos alunos mais destacados da BMSM em 2013. No mesmo ano, como membro do Quarteto Brasileiro de Tel Aviv, ele conquistou o primeiro lugar no concurso de música de câmara BMSM, apresentando-se posteriormente com o conjunto em salas de concerto da Alemanha, Israel e Brasil.
Landim atuou como concertino da Orquestra Sinfônica da Escola de Música Buchmann-Mehta em apresentações no Carnegie Hall em Nova York, no Auditório Charles Bronfman em Tel Aviv e em turnê no Brasil sob a orientação do maestro Zubin Mehta. Como membro da Orquestra de Câmara de Israel e do Conjunto de Solistas de Tel Aviv participou em concertos em Israel e na Rússia. Foi spalla da Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo de 2015 a 2018 e é spalla da Orquestra Filarmônica de Goiás desde 2015.

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