A Orquestra Filarmônica de Goiás não pode parar

A Orquestra do Coração do Brasil: foi este o slogan para a nossa temporada de 40º aniversário. Entramos em 2020, como todo mundo, com esperança. Mas, desde o final de setembro, cinquenta músicos, cinquenta famílias, estão sem salário, sem meios de sustento. Há agora um buraco no coração de Goiás e da cultura brasileira. 

Desde 2014, a Orquestra Filarmônica de Goiás tem sido uma parte central da minha vida. Em sete curtos anos caminhamos um longo percurso juntos e contribuímos de forma incomensurável para a vida cultural de Goiás e do Brasil. 

Qualidade, democratização da música clássica e compromisso com a música brasileira têm sido centrais para a Filarmônica de Goiás desde o início.

Há muito o público de Goiás merecia uma orquestra do mais alto nível e nos últimos anos ele teve a chance de acompanhar o mais amplo espectro de repertório já ouvido no Estado: os Concertos de Brandemburgo de Bach, Haydn (o começo do primeiro ciclo completo de suas sinfonias na América do Sul), Mozart, Beethoven, Brahms, Bruckner, Mahler, Stravinsky, estreias brasileiras de obras icônicas de Pierre Boulez, Luigi Nono, Elliott Carter e Olivier Messiaen. Sempre me disseram que isso seria impossível, que as plateias não aceitariam...! O que descobri foi o exato oposto.

“A democratização da música clássica foi um princípio fundamental da orquestra desde o início da minha gestão”

O público de Goiás é o mais aberto e receptivo que já encontrei! Está sedento por novas experiências. Minha primeira regra como diretor artístico era “mostrar respeito pelo nosso público” e o público recompensou minha confiança com amor e apoio à orquestra inabaláveis. 

A democratização da música clássica foi um princípio fundamental da orquestra desde o início da minha gestão. A música clássica é muitas vezes caracterizada como elitista, mas minha visão é a de que as coisas são elitistas quando as pessoas não têm acesso a elas. Nos últimos sete anos, o público teve acesso ao mais extraordinário leque de repertório e de artistas. Tudo de graça. Mesmo outras orquestras de Goiânia cobram pelos ingressos.

Mas onde você pode ouvir Nelson Freire tocando Brahms ou Isaac Karabtchevsky regendo Mahler de graça? Eu diria que, na verdade, somos a orquestra mais democrática do Brasil! Sempre tivemos uma forte conexão com o público em nossos projetos educacionais, concertos ao ar livre em parques, apresentações em shopping centers, no Festival Bananada e nos nossos inovadores concertos de música de câmara no Bolshoi Pub. Quem pode esquecer o efeito de um programa com obras de Stockhausen, Berio, Birtwistle e Martland no público?

O projeto Brasil em Concerto do Selo Naxos e do Itamaraty é o mais amplo na história da música brasileira. Apenas três orquestras entre todos os grupos brasileiros foram selecionadas. E a razão é clara: qualidade musical.

“A Orquestra do Coração do Brasil deve ter seu próprio coração restaurado: seus amados músicos”

A Orquestra Filarmônica de Goiás é hoje reconhecida como uma das mais importantes embaixadoras da música brasileira e com o lançamento dos CDs levará este repertório e o nome de Goiás para todos os cantos do mundo. Recebemos a Ordem do Rio Branco em 2018 por nossos serviços em prol da música brasileira, a única instituição cultural de Goiás a já receber essa distinção.

A Orquestra Filarmônica de Goiás não pode, não deve parar. Somos uma parte vital da vida cultural goiana e brasileira. Os músicos têm se comportado com grande dignidade e paciência durante toda essa situação terrível, mas agora é hora de apoiá-los. A Orquestra do Coração do Brasil deve ter seu próprio coração restaurado: seus amados músicos.

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