Henrique Morelenbaum morre no Rio de Janeiro aos 90 anos

por Redação CONCERTO 22/07/2022

Uma das maiores personalidades musicais de nosso tempo, Morelenbaum foi maestro, professor e primeiro diretor da Sala Cecília Meireles

Morreu hoje no Rio de Janeiro o maestro Henrique Morelenbaum, uma das maiores personalidades musicais de nosso tempo. Em novembro passado, Morelenbaum, que era membro da Academia Brasileira de Música, havia completado 90 anos.

Nascido na Polônia em 1931, Henrique Morelenbaum chegou ao Brasil com a família aos 3 anos de idade. Em matéria de Camila Fresca publicada na Revista CONCERTO em 2006, quando completou 75 anos, Morelenbaum contou que, no navio em que fazia a viagem, havia dois violinistas. “Quando eu ouvia o som do instrumento corria atrás deles. Eles fechavam a porta, mas eu ficava escutando. Para me tranquilizar, minha mãe me prometeu que, quando chegássemos ao Brasil, meu pai me daria um violino”.

Morelenbaum estudou violino e viola com Paulina d’Ambrosio na Escola de Música da UFRJ. Ali também formou-se em composição e regência e fez seu doutorado. No artigo da CONCERTO, Morelenbaum relembra de outra passagem de sua formação, quando ainda era membro de uma orquestra de estudantes: “Lá, além de tocar, comecei a ‘rabiscar’ coisas. Guerra-Peixe, que era amigo de meu professor, tomou contato com um desses rabiscos, a Marcha da liberdade. Ele gostou e orquestrou a peça – a música era ruim, mas a orquestração ficou ótima. Pouco depois, Erich Kleiber veio ao Rio e assistiu um ensaio nosso. Entre outras músicas resolveram tocar minha marcha. Na hora de apresentá-la, o maestro mandou eu me levantar para reger. Eu nunca tinha regido na vida, mas, como não se costumava discutir naquela época, obedeci. Assim foi que regi pela primeira vez, uma peça própria e tendo como ouvinte Erich Kleiber, sua esposa e uma criança, que depois viria a se tornar o grande regente Carlos Kleiber”.

Em sua carreira, Henrique Morelenbaum dirigiu todas as grandes orquestras brasileiras, foi regente da Orquestra e do Coro Sinfônico da Universidade do Chile, diretor do Theatro Municipal do Rio de Janeiro e da Sala Cecília Meireles. Conquistou prestígio também como regente de balé, tendo sido o único brasileiro a dirigir o Balé da Ópera de Paris, em 1973, em três balés de Stravinsky. Morelenbaum regeu as estreias brasileiras de marcos da música do século XX, como as óperas Peter Grimes, de Britten – com a presença do compositor –, e The Rake’s Progress, de Stravinsky, e a Sinfonia de Luciano Berio. Ao longo de sua carreira, o maestro comandou 550 títulos de peças sinfônicas, 42 de óperas e mais de 70 de balés. 

Henrique Morelenbaum também teve uma importante atuação docente, tendo sido professor de contraponto, harmonia e composição na UFRJ. Entre seus alunos figuram compositores como David Korenchendler, Ronaldo Miranda, Cirlei de Hollanda, João Guilherme Ripper e André Cardoso, entre muitos outros. Em um artigo para a Academia Brasileira de Música, Ronaldo Miranda escreveu: “Creio que o maior mérito de Morelenbaum, como professor da matéria, foi deixar cada aluno seguir o caminho musical por ele próprio escolhido. Jamais impôs um estilo, uma linguagem, um movimento estético exclusivo. Forneceu a todos uma sólida base técnica e mostrou à sua classe um panorama eclético da criação musical contemporânea”.

João Guilherme Ripper, diretor da Sala Cecília Meireles, lamentou a morte de Morelenbaum: “Ele fez a estreia de importantes obras do século XX, participou dos festivais de música contemporânea da Guanabara, ele foi muito importante para a música brasileira em geral. E foi meu grande professor, de contraponto e composição e depois como orientador de meu mestrado. Para mim, Morelenbaum foi um modelo de artista e também de gestor, pois foi o meu antecessor e primeiro diretor da Sala Cecília Meireles”.

André Cardoso, presidente da Academia Brasileira de Música, declarou: “Henrique Morelenbaum foi uma das mais importantes personalidades da vida musical brasileira dos últimos 70 anos, como instrumentista, regente, professor e administrador. Deixou sua marca nas instituições onde trabalhou, a Escola de Musica da UFRJ, o Teatro Municipal do RJ, a Sala Cecília Meireles e a Academia Brasileira de Música. Dedicadíssimo aos seus alunos, formou várias gerações de regentes e compositores, dentre os quais me incluo, com muita gratidão. Como intérprete foi um dos que mais abordou a música brasileira e o repertório contemporâneo. Ele cumpriu sua missão. Seu legado segue agora pelas mãos de seus filhos, todos músicos excepcionais, e seus alunos. Obrigado, mestre”.

Na matéria da Revista CONCERTO, de 2006, Morelenbaum revelou: “Nunca planejei nada, mas sempre gostei de estudar muito e estar preparado para tudo. Não tenho outra atividade, toda a minha vida é ligada à música. Eu vivo música. Minha esposa é pianista, nos apresentávamos juntos. Quando nos casamos, eu tinha 15 e ela 14 anos”.

O casal teve três filhos, todos músicos profissionais: Lucia, clarinetista, pianista e harpista; Eduardo, regente coral; e o violoncelista Jaques Morelenbaum.

[O enterro de Henrique Morelenbaum será às 11h30, no cemitério de Vila Rosaly novo, saindo do Chevra Kadisha às 10h30.]

O maestro Henrique Morelenbaum, em vídeo de 2011 (reprodução YouTube)
O maestro Henrique Morelenbaum, em vídeo de 2011 (reprodução YouTube)

 

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Comentários

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Nosso país perde mais um grande brasileiro. Morelenbaum sempre foi sinônimo de integridade, humildade, humanidade e capacidade. À sua família, meus mais sinceros sentimentos.
Fabio Mechetti

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