O Theatro Municipal de São Paulo abre sua temporada lírica neste sábado, dia 15, com uma das mais comentadas e discutidas montagens de ópera dos últimos anos no Brasil: O guarani, de Carlos Gomes, na concepção de Ailton Krenak, direção cênica de Cibele Forjaz e dramaturgismo de Ligiana Costa. A produção, estreada em 2023, se propõe a pensar a obra do compositor à luz de questões atuais envolvendo os povos originários, que participam do espetáculo com o objetivo de propor uma releitura da história baseada em José de Alencar.
O elenco da remontagem é formado por cantores como Laura Pisani, Maria Carla Pino Cury, Enrique Bravo, David Marcondes, Licio Bruno e Savio Sperandio, além dos atores Araju Ara Poti e Zahy Tenthar. As récitas acontecem nos dias 15, 16, 18, 19, 21, 24 e 25 de fevereiro, com Roberto Minczuk à frente da Orquestra Sinfônica Municipal, do Coro Lírico Municipal e da Orquestra e Coro Guarani do Jaraguá Kyre’y Kuery.
“Peri é uma caricatura de índio ridícula, a que estamos sujeitos há 150 anos.” Assim Krenak definiu o personagem-título da ópera em entrevista ao Site CONCERTO em 2023. “Os povos originários se sentem ofendidos pela narrativa da ópera. E ela traz um dano cultural enorme por ter sido perpetuada acriticamente por tanto tempo. O Guarani... Não sei se o verbo existe, mas a obra ‘despessoa’ o sujeito e o transforma em uma figura mítica. E uma pessoa mitológica não precisa de comida, de terra, de vacina.”
ACERVO CONCERTO 'O guarani', por Lauro Machado Coelho
Cibele Forjaz também conversou com a CONCERTO na época da estreia da produção, que venceu naquele ano o Prêmio Lauro Machado Coelho de Ópera na votação do público do Prêmio CONCERTO. Para ela, a ópera, ao propor um sentido de integração nacional no qual o indígena passa por um processo de catequese, acabou servindo como base “de uma identidade nacional na qual o invadido precisa ser vestir da cultura do invasor”. “Essa integração é uma forma de genocídio e extermínio. Toda a luta do povo indígena nos últimos cem anos é o oposto disso, é o direito à diferença, a culturas vivas, que dialogam com o contemporâneo a partir de suas crenças, culturas e línguas”, explica a diretora.
Para dar forma a essa ideia sobre o palco, a diretora trabalhou a noção do “duplo”. De um lado, está o cantor lírico interpretando Peri, cantando em italiano. E, de outro, um ator do povo guarani Mbya. Os cenários, por sua vez, evocam uma metáfora do Padre Antônio Vieira, recuperada pelo antropólogo Eduardo Viveiros de Castro em O mármore e a murta. A rigidez do mármore está associada ao colonizador, enquanto a murta, a planta, está sempre em movimento. São três planos. “A obra de arte, pois é importante que a força da ópera esteja íntegra. Uma pedreira de mármore. E, atrás da pedreira, a aldeia, que começa invisibilizada e vai aparecendo ao longo da ópera, até atravessar a pedreira”, explicou Cibele Forjaz.
Veja mais detalhes no Roteiro do Site CONCERTO
Relembre o espetáculo apresentado em 2023
Ligiana Costa Por uma ópera indômita
Jorge Coli Nova montagem de "O guarani" reafirma sua grandeza como obra capital da nossa história
João Luiz Sampaio 'Guarani' ganha leitura poética em concepção de Ailton Krenak e Cibele Forjaz
![Cena da montagem da ópera apresentada em 2023 [Divulgação]](/sites/default/files/inline-images/w-guarani_municipal_0.jpg)
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