‘O turco na Itália’, de Rossini, foi maravilhoso

por Jorge Coli 27/09/2021

Com um elenco, dentre os melhores que se poderia reunir no país, a ópera abriu o Festival de Ópera de Guarulhos

Enquanto o Theatro Municipal de São Paulo não sabe se casa, compra um guarda-chuva ou faz ópera – não consegue apresentar nenhum programa sério nem projetos claros –, é Guarulhos que dá o exemplo. Não espera – pega e faz!

Iniciou neste último fim de semana seu FOG – Festival de Ópera de Guarulhos. Tem um orçamento ínfimo em relação a São Paulo. Seu teatro, o Adamastor, é simpático, foi reformado, está com poltronas novas, mas apresenta uma séria limitação para os espetáculos líricos: não possui fosso de orquestra.

Ainda assim, O turco na Itália, de Rossini, que inaugurou o Festival, foi maravilhoso. Primeiro, pelo elenco, dentre os melhores que se poderia reunir no país. O Selim de Sávio Sperandio é antológico: seu vozeirão esplêndido, associado a uma atuação irresistível, numa comicidade absolutamente justa, fazia par com outro formidável baixo, Saulo Javan, no papel de Geronio: dois gigantes. O dueto entre ambos que inicia o segundo ato, D'un bell'uso di Turchia, foi um momento de euforia hilariante.

Tati Helene, entorno de quem o FOG parece ter organizado seu programa, já que ela é a protagonista das duas óperas que serão programadas para outubro e novembro, O Cônsul, de Menotti, e Rusalka, de Dvorak (e tanto melhor), encarnou com perfeita convicção uma Fiorilla-Marilyn Monroe, com um vestido vermelho sexy e uma peruca loira. Venceu bravamente as dificuldades da sua parte com desenvoltura e segurança.

Anibal Mancini é o maravilhoso tenor que já deu tantas provas de sua arte. Vestido como pierrô, ou o palhaço sério do circo, como foi poética a interpretação da sua grande ária Tu secondo il mio disegno, outro grande momento de um espetáculo repleto de grandes momentos!

Juliana Taino foi excelente como Zaida. Vinícius Atique deu ao espetáculo uma notável animação com seu Prosdocimo, o poeta. Cleyton Pulzi completou o elenco no papel do confidente Albazar, em travesti de fato engraçado.

André Heller-Lopes, diretor cênico, tinha vários problemas a enfrentar, entre eles o da situação da orquestra, disposta por trás da cena. Resolveu excelentemente, inventando um tom circense que funcionou muito bem, sem carregar demais nos efeitos. Dispôs várias cortinas transparentes, formando um retângulo – solução econômica e perfeitamente eficaz. O caráter enxuto dos cenários pôs em evidência a qualidade inventiva das roupas, que se destacavam e coloriam o palco. A direção de cena foi perfeitamente justa: poderia descambar para excessos caricaturais, mas evitou isso, sintonizando-se com a maravilhosa música de Rossini.

A orquestra de Guarulhos, regida por Emiliano Patarra, mostrou sua precisão e sua verve. Patarra é o organizador do Festival, o maestro dessa orquestra. Feliz de Guarulhos, que escolheu alguém tão ativo e tão excelente músico!

O libreto de Il turco in Italia, de Felice Romani (autor, entre muitos outros, dos libretos da Norma e da Sonnambula, de Belini, assim como do Elisir d’Amore de Donizetti), é um dos mais inteligentes que existem. Um poeta escreve a peça na medida em que ela se desenrola, e os personagens intervém, pedindo que altere isso ou aquilo. Todas essas situações foram resolvidas com grande felicidade.

É um espetáculo econômico, de fácil transporte. Poderia ser apresentado em várias cidades.

Enfim, pela estreia, o FOG promete. As três óperas selecionadas são raras e são grandes obras. Há ainda, previsto, um concerto Verdi com Marli Montoni e Paulo Mandarino, dia 16 de outubro.

Assista abaixo à gravação de O turco na Itália realizada pelas Orquestras de Guarulhos.
 

 

Detalhe da cena de ‘O turco na Itália’, produção das Orquestras de Guarulhos (reprodução)
Detalhe da cena de ‘O turco na Itália’, produção das Orquestras de Guarulhos (reprodução)

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Comentários

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Bravo, Coli. O Turco na Itália foi magnífico e as montagens em Guarulhos têm sido um alento para todo nosso público de ópera. Tomara que possa mesmo viajar para outras cidades.

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