Compositor e pianista Fernando Dias Gomes lança seu primeiro disco. “Estou tentando me encontrar como artista e como pessoa”, diz
No dia 25 de abril, foram anunciados os finalistas do 30º Prêmio da Música Brasileira. Três jovens músicos comemoraram nas redes sociais a indicação para a categoria “Revelação”: o pianista Fernando Dias Gomes e os violonistas Maurício Guil e Plínio Fernandes. Os três lançaram seu primeiro álbum solo em 2022.
Nascido na zona norte da cidade de São Paulo, Fernando é o mais novo deles: aos 20 anos, estuda composição na USP. Iniciou os estudos musicais aos 13 anos e, dois anos depois, ingressou na Emesp Tom Jobim como aluno de Karin Fernandes, uma das mais ativas pianistas da atualidade. O músico destaca o estímulo e apoio de Karin em seus primeiros passos como compositor – ela chegou a estrear peças dele em recitais e acompanhou a gravação do disco.
Fernando conta que a composição entrou em sua vida praticamente junto com os estudos das primeiras notas, e ele passou a escrever pequenas obras para piano, violão e pequenas formações. Piano vol.1 é um apanhado do que ele produziu até o momento, reunindo desde suas primeiras composições até obras escritas para o projeto.
Com onze faixas, o disco é interessante e surpreendente para um garoto de 19 anos (idade que ele tinha à época da gravação). Há peças que nascem da exploração do instrumento, como a série de Gestos; outras que se inspiram em gêneros regionais – Guarânia e a ótima Chamamé; a lírica Momento; ou ainda Boi de ferro, que traz a lembrança do melhor que a escola nacionalista brasileira produziu – Fernando diz que um de seus compositores prediletos é Camargo Guarnieri, e aqui ele segue os passos do mestre com sucesso.
O jovem compositor, que está construindo uma voz própria e cujos passos merecem ser acompanhados, conversou com o Site Concerto sobre sua formação e carreira.
Como você chegou no piano? Alguém na sua casa era músico?
Acho que foi muito espontâneo. Não vim de uma família musical nem artística, meu pai era garçom e minha mãe, funcionária pública. Sempre me interessei por música e lembro de escutar muita música na infância: o rádio da cozinha, trilha sonora de jogos eletrônicos, os CDs do meu pai. Depois, pela internet, descobri a música de concerto, daí foi questão de tempo até eu convencer minha mãe a me colocar nas aulas de piano. Tudo muito natural.
E do piano para a composição, como foi?
As duas coisas sempre andaram juntas comigo. Sempre fui uma pessoa curiosa e criativa, logo quando comecei a aprender as primeiras notas no teclado e a escrever partitura fiz minhas primeiras músicas: escalas ascendentes e descendentes, tríades emblocadas. Lembro uma vez que perguntei ao meu professor se era aceitável tocar uma escala cromática descendente com o pedal até o final. Acho que desde aquela época tinha curiosidade com sons diferentes, massas sonoras e afins. Depois, quando entrei na Emesp, fui me aperfeiçoando até chegar na USP, tudo foi acontecendo de forma gradual, com muito estudo, e vontade de fazer música nova no piano. Sou muito grato à minha professora Karin Fernandes, que sempre me deu muito apoio na composição, mesmo sem ter dado uma aula de composição foi uma das pessoas que mais me apoiaram e até hoje continua a me apoiar.
Como é o seu processo de composição? Nasce do trabalho com as teclas do piano? Nasce na cabeça e vai para o papel direto?
De tudo um pouco, na verdade. Pode ser através destas duas opções ou até por uma terceira, quarta, enfim. Processo composicional é algo bem complicado de se explicar na verdade, e acho que a resposta muda cada vez que me perguntam isso. Mas para este álbum posso dizer que foi através do piano e “coisas da minha cabeça”: um som que encontro no piano, que vai ecoando na minha cabeça até tomar corpo, e que no final preciso só colocar para fora. Ou um som que já existe na minha cabeça e preciso encontrar uma maneira de dar um corpo a ele. Meu processo muitas vezes é algo muito abstrato; às vezes é espontâneo; outras vezes segue regras e padrões estabelecidos. Está sempre está impregnado com um pouco de cada.
E com relação ao estilo, às referências estilísticas? Quando você fala em músicas de influência regional, está pensando no que exatamente?
A respeito da música regional me refiro às faixas 10 e 11, Guarânia e Chamamé, que fiz inspirado na temática de música de fronteira. A guarânia é muito tradicional do centro-oeste do país, no Mato Grosso do Sul, e o chamamé é comum no estado do Rio Grande do Sul. São gêneros pelos quais tenho um certo apreço e quis fazer algo que dialogasse com um Brasil de fronteira. O restante das faixas vem obviamente de uma bagagem mais formal, que fui adquirindo com o estudo do repertório pianístico.
Que tipo de música você gosta de ouvir, independentemente do seu trabalho? E que compositores ou obras te estimulam, mexem com você?
Sou bem eclético para música. Uma pena que não tenho muito tempo para parar e escutar música profundamente; enquanto estou respondendo esta pergunta, estou ouvindo Selmasongs, da Björk. Gosto de tudo: música de concerto, música regional, breakcore, experimental, MPB, e estou começando a ouvir um pouco de House por causa do meu namorado. Os compositores dentro da música de concerto que mais me encantam são o Guarnieri e o Ravel, também sou muito fã do Matt Stephenson dentro do breakcore. Recentemente descobri a Vanessa Moreno e achei incrível o trabalho dela, sou muito fã.
Você tem 20 anos, está estudando composição na universidade, lançou o primeiro disco: você tem planos imediatos? E o que imagina para o seu futuro na música?
Acho que meus maiores planos para agora são me formar, tentar um mestrado no exterior em composição, lançar outro álbum e conseguir viver da minha profissão. Eu espero que minhas próximas produções estejam cada vez mais atreladas comigo. Piano vol.1 trata de um lado do Fernando, acho que ainda tem muita coisa que quero dizer e fazer além da música instrumental para piano. Atualmente estou numa fase de experimentação, estou tentando me encontrar como artista e como pessoa.
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