Em ‘Candinho’, o momento do despertar artístico

por Luciana Medeiros 16/09/2024

Começou dia 13, sexta-feira, o II Festival Oficina da Ópera do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, com a apresentação da ópera inédita Candinho, de João Guilherme Ripper. A programação seguiu com La Serva Padrona, de Pergolesi, no final de semana, e termina com Le Villi, de Puccini (dias 19, 20 e 21/9), que pela primeira vez será montado na casa carioca. 

Idealizado por Eric Herrero, diretor artístico do teatro carioca, o festival tem como objetivo a formação/capacitação de profissionais para o gênero, “entre diretores, cenógrafos, figurinistas, iluminadores, maquiadores e assistentes”, conta Herrero. “Ao todo, são 25 participantes este ano, com 14 estreias de artistas nessa temporada 2024, com mentoria dos profissionais do Municipal.”

Candinho, com música e libreto de Ripper, direção cênica de Daniel Salgado e regência de Roberto Duarte, traz ao palco a pequena Brodowski, cidade paulista onde nasceu o grande pintor brasileiro, em 1903. Numa sequência de quadros cênicos, que têm projeções de pinturas de Portinari, o elenco transita num cenário esquemático, que ressalta o tratamento visual dos figurinos – retirados das telas, como a camisa quadrada dos escolares e as pipas bordadas – e do visagismo, que espalhou simpáticas pinceladas nos rostos dos cantores. 

Em 1h15, sucedem-se pequenas histórias ou ambientes – a escola, a visita à menina mais bonita da cidade, a paixão infantil entre Candinho e Branca, a chegada do circo – com o objetivo de conduzir ao momento que seria o despertar do talento artístico, finalizando com a ida de Cândido para o Rio de Janeiro. Com momentos de grande delicadeza, harmonias vocais, brasilidade, o elenco tem ótimas vozes: o elogiado jovem tenor Guilherme Moreira, a mezzo Erika Henriques (Candinho) e a soprano Ariel Castilho (Branca), e a bela participação do Coro Infantil da UFRJ, de Maria José Chevitarese.

Na palestra oferecida antes do espetáculo, João Guilherme Ripper e João Cândido Portinari (filho do pintor) falaram do desejo de trabalharem juntos (Ripper tem, inclusive, um ciclo de canções de 2003 com poemas de Portinari) e do material no qual foi baseado o libreto. “Um dia, João Cândido me mostrou cadernos das memórias de infância do pai – e eu vi tudo lá, pronto, cenário, roteiro, figurinos”, disse Ripper. “Só incluí um personagem ficcional, o palhaço.”

João Cândido reforça que o ambiente da cidade onde o pai nasceu era mesmo “onírico, lírico, com três ruas e o cafezal em volta”. E ressaltou que a ópera é mais uma maneira de levar o Projeto Portinari, iniciado há 45 anos, aos seus objetivos de divulgar a obra de Cândido Portinari.

A ópera foi encomendada pelo projeto Sinos (Sistema Nacional de Orquestras Sociais) e seguirá carreira. Dia 13 outubro será montada pelo Neojiba, em Salvador, em versão semi-encenada; em 2025, novas produções sobem aos palcos do Theatro São Pedro de Porto Alegre e do Theatro São Pedro de São Paulo. 

Cena da produção da ópera 'Candinho' no Theatro Municipal do Rio de Janeiro [Divulgação/Daniel Ebendinger]
Cena da produção da ópera 'Candinho' no Theatro Municipal do Rio de Janeiro [Divulgação/Daniel Ebendinger]

La Serva Padrona, de Pergolesi, teve direção de Ana Vanessa Silva Santos e Jésus Figueiredo. No elenco, a soprano Michele Menezes (Serpina), o baixo Saulo Javan (Uberto) e o ator Ludoviko Vianna (Vespone), vivendo a história da criada determinada a se casar com o patrão, que fez sua estreia em Nápoles, em 1733.

Já sobre Le Villi, que encerra o festival no âmbito das homenagens pelo centenário de morte Puccini, Eric Herrero diz: “não consigo entender como não foi feita até hoje no Theatro Municipal... reúne as três linguagens artísticas que compõem a casa”. Com direção musical e regência do titular, Felipe Prazeres, a ópera tem concepção, direção cênica e coreografia de Bruno Fernandes e Mateus Dutra, “bailarinos do nosso corpo de baile”.

As Villis são espectros de mulheres abandonadas (aparecem também no balé Giselle); a ópera-balé estreou em 1884 e a história segue o roteiro da vingança sobrenatural: os homens culpados pelos abandonos são levados a dançar até a exaustão e à morte.

Diversas parcerias estão em ação: com o Istituto Italiano di Cultura (“que já nos apoiou em Il Trittico e agora traz o ator Nicolas Siri como narrador”, lembra Herrero) e com a Escola de Artes Visuais do Parque Lage (“estrearemos um telão pintado por artistas da EAV especialmente para a produção”). O corpo de baile recebeu reforços. No elenco, nomes conhecidos e jovens: revezam-se as sopranos Marly Montoni e Marianna Lima como Anna, os tenores Lazlo Bonilla e Ivan Jorgensen (Roberto) e os barítonos Santiago Villalba e Flávio Mello (Guglielmo), além da participação especial da primeira bailarina do TMRJ, Claudia Mota.

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