Assim Mischa Maisky se define em entrevista na qual fala sobre sua carreira e sobre os concertos que faz neste mês pela temporada do Mozarteum Brasileiro
Mischa Maisky estará no Brasil para concertos e uma masterclass neste mês. O músico de 71 anos, um dos mais importantes violoncelistas do mundo, aporta em São Paulo em meio a uma agenda incessante de viagens e apresentações. Em outubro, depois de tocar com uma orquestra jovem na Alemanha, Maisky estava em Tel-Aviv, para participar da despedida do maestro Zubin Mehta (que está deixando o cargo de titular da Filarmônica de Israel e se aposentando), quando conversou com a Revista CONCERTO, por telefone. “Conheço o maestro Zubin Mehta há mais de quarenta anos e me sinto honrado em ser o único violoncelista a participar desses concertos”, afirmou.
De Israel, ele ainda seguiria para recitais em duas cidades suíças e, então, faria uma pequena turnê pela Coreia, antes de embarcar para a América do Sul – Maisky se apresenta em Lima, no Peru, antes de ir para São Paulo para apresentações nos dias 12 e 13, pela temporada do Mozarteum Brasileiro. “Tenho viajado muito, não é fácil”, confessou, logo no início da conversa. O entusiasmo na voz e a disposição em falar sobre seu ofício, no entanto, não deixavam dúvidas em relação a sua satisfação.
Nascido em Riga, na Letônia, em 1948, Mischa Maisky estudou na Rússia e, mais tarde, tornou-se cidadão de Israel. Desde cedo viajando por diferentes lugares, ele diz se considerar um “cidadão do mundo”. Teve como professores duas lendas do violoncelo, o russo Mstislav Rostropovich e o ucraniano Gregor Piatigorsky.
“Ambos tinham personalidades incríveis, embora fossem muito diferentes”, relembra. “Ao mesmo tempo, tinham algumas coisas em comum: praticavam um ensino diferente do habitual, pois não falavam de tecnicalidades do instrumento, mas de música”, explica. “Tive muita sorte em passar quatro anos com Rostropovich em Moscou. E depois estive por quatro meses muito intensos com Piatigorsky em Los Angeles. Nós nos víamos todos os dias, foi a melhor época de minha vida. Era o fim da vida dele, e ele sabia disso. Eu era jovem e estava cheio de energia, então era uma troca. Ele amava falar russo comigo, falava um russo muito bonito, bem diferente do que se fala hoje. Acho que foi a última chance de ele dividir essa incrível cultura com alguém. Foi intenso, inesquecível. E é por isso que me considero o violoncelista mais sortudo do mundo.”
Hoje, é Mischa Maisky quem é procurado pelos jovens músicos como um mestre de quem se pode adquirir conhecimentos importantes. E ele adora trabalhar com os alunos. “Sinto-me em casa, pois sou jovem de coração. Tento não olhar muito no espelho porque então vejo meus cabelos brancos e me lembro que tenho quase 72 anos [risos].”
O nível técnico dos jovens violoncelistas hoje, segundo Maisky, é “fenomenal”. “Sempre houve jovens violoncelistas fantásticos, em minha juventude e também antes. Mas a quantidade e a consistência do nível técnico de hoje é incrível. Ao mesmo tempo, pelo fato de o nível ser tão alto, há sempre um perigo de que os jovens músicos pensem só em tocar cada vez mais rápido, cada vez mais limpo, cada vez mais alto”, reflete.
Maisky afirma que ele mesmo “está longe” de ter o toque mais “limpo” ou mais “correto”: “Muitos violoncelistas tocam melhor que eu, de certa forma. E eu poderia tocar de forma mais ‘correta’ e mais limpa ou perfeita, se isso para mim fosse a coisa mais importante. No entanto, sei que inevitavelmente iria sacrificar muito de minha expressividade musical. Então eu não me importo de correr riscos e ser criticado às vezes, contanto que tenha a oportunidade de atingir o coração das pessoas”, afirma.
Depois de dar uma masterclass na Emesp – Escola de Músca do Estado de São Paulo, ele toca os concertos de Schumann e Dvorák na Sala São Paulo, com a Orquestra Sinfônica RTV Eslovênia. Quando pergunto sobre as particularidades de cada obra, ele afirma que sua melhor língua “é a da música”: “Prefiro expressar tudo o que sinto, o que amo e o que sei sobre a música por meio da própria música, em vez de falar sobre ela”, explica, convidando o público a ir aos concertos para “encontrar as respostas” no palco.
Artista exclusivo do selo Deutsche Grammophon por mais de trinta anos, Maisky realizou dezenas de gravações com as maiores orquestras do mundo, ganhou prêmios e segue tocando nos mais importantes palcos internacionais. Além de solista, é um camerista dos mais disputados, já tendo trabalhado com os maiores músicos de seu tempo.
“Estive com Pablo Casals dois meses antes de sua morte, fiz concertos e gravações com Leonard Bernstein. Tive e tenho parceiros incríveis em música de câmara, como Radu Lupu, minha grande amiga Martha Argerich ou Nelson Freire – um de meus pianistas preferidos de todos os tempos. Também tenho filhos lindos e uma esposa maravilhosa. Sou, portanto, não apenas um violoncelista muito sortudo, mas um homem bastante afortunado.”
AGENDA
Orquestra Sinfônica RTV Eslovênia
Raoul Grüneis – regente / Mischa Maisky – violoncelo
Dias 12 e 13, Sala São Paulo