Discos recuperam raridades musicais luso-brasileiras do século XIX

por Luciana Medeiros 30/06/2022

Nessa sexta-feira, dia 1° de julho, os salões oitocentistas no Brasil e em Portugal serão revividos em um concerto no Salão Nobre do Museu da Justiça, no Rio de Janeiro. O tenor Alberto Pacheco e os pianistas Andrea Luisa Teixeira e Silas Barbosa sobem ao palco para celebrar o lançamento dos CDs Recitativos de Salão e Peccato: melodias do romantismo brasileiro, que trazem peças inéditas em disco e desconhecidas do público – e da maioria dos estudiosos da música do período. 

Pacheco e Andrea, que formam desde 2011 a Academia dos Renascidos – referência à Academia Brasílica dos Renascidos, fundada em Salvador em 1759 para estimular a produção literária na então capital da colônia –apresentam os recitativos. O gênero conviveu com as modinhas, mas define a “canção” feita de um prelúdio instrumental seguido por uma valsa sobre a qual é declamado um poema – e que caiu no esquecimento.

Segundo as pesquisas de Pacheco, um dos mais conhecidos atores de seu tempo, o português Furtado Coelho (1831-1900) foi o responsável pela propagação do gênero, em Portugal e no Brasil.  

“No universo lírico, o recitativo ainda é uma voz cantada”, explica Pacheco, que descobriu por acaso as partituras na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. “Peguei uma partitura e estava lá o gênero ‘recitativo’, mas não havia uma melodia. Descobri que eram poemas declamados." 

Entre os compositores que se dedicaram ao gênero estão nomes conhecidos como Chiquinha Gonzaga e Artur Napoleão e, dentre os poetas, Castro Alves e Gonçalves Dias. Os temas poéticos seguem em muitas direções, prossegue a pianista: “Há, por exemplo, O filho da lavandeira, de Sant’Anna Gomes (1834-1908), que aborda a escravidão. São poemas jocosos, dramáticos, românticos. Trata-se, enfim, do retrato de uma época”.

São 20 peças no CD, projeto abraçado e lançado pelo MPMP – Patrimônio Musical Vivo, organização portuguesa de tremenda atuação na pesquisa e na valorização da música luso-brasileira. “O desafio de reviver essas peças foi justamente o de reunir poesia e acompanhamento, porque não tínhamos qualquer referência disso”, conta Andréa. “Como a música e a poesia funcionavam juntas? Aos poucos fomos descobrindo. E a música é muito saborosa. Parece ser fácil, mas tem muitas dificuldades técnicas.”

Além do CD, foi lançado pelo MPMP um livro com as partituras dos recitativos que a dupla registrou em disco.
Peccato é o resultado da pesquisa de Pacheco nos periódicos brasileiros publicados entre 1842 e 1922, reunindo as partituras levadas ao público leitor, uma colaboração de Pacheco com o pianista Silas Barbosa, doutorando da UFRJ.

Essa antologia foi publicada pela instituição – Cancioneiro dos periódicos da Fundação Biblioteca Nacional – e não tinha qualquer registro fonográfico anterior. “Há peças de Glauco Velásquez, Leopoldo Miguez, Meneleu Campos e Francisco Manuel da Silva, por exemplo”, lista Pacheco. “A maioria absoluta ninguém conhecia e ficou inédita em disco.” O projeto também tem um livro que pode ser acessado on-line.

Alberto Pacheco e Andrea Luisa Teixeira são músicos atuantes, pesquisadores e professores universitários – ele, da UFRJ, ela da Federal de Goiás. Ambos têm fortes laços com a música portuguesa.

Detalhe da capa do disco 'Raridades' [Reprodução]
Detalhe da capa do disco 'Raridades' [Reprodução]

 

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