A compositora portuguesa Andreia Pinto Correia nasceu em 1971 em Lisboa, onde fez seus primeiros estudos musicais e, mais tarde, formou-se na Universidade de Lisboa. De lá, mudou-se para os Estados Unidos, para completar seu doutorado no New England Conservatory of Music. Hoje, vive em Nova York, com uma carreira em franca ascensão.
Nos últimos anos, ela recebeu encomendas de grupos como a Filarmônica de Nova York – Pássaros da noite, com regência de Gustavo Dudamel, que encomendou a ela uma outra obra, a ser estreada pela Filarmônica de Los Angeles; em 2023, o Brooklyn Rider, grupo de referência na música nova americana, fez a estreia de seu novo quarteto, Aere senza stelle.
Pinto Correia nasceu em um ambiente marcada pela cultura. Seus pais, ela contou em uma entrevista recente, são professores universitários. “Eles influenciaram muito minha maneira de ver a arte. Olhando para trás, entendo o quão imensamente privilegiada fui por crescer perto deles. O meu pai era medievalista, professor de literatura na Universidade de Lisboa. Minha mãe era professora de literatura alemã, responsável pelas traduções para o português de alguns dos maiores escritores do mundo: Goethe, Robert Musil, Stefan Zweig, Thomas Mann”, disse.
“Quando eu era criança, lembro-me de ouvir as leituras de Goethe de minha mãe e as histórias medievais de meu pai antes de ir para a cama. Como eu poderia não ser influenciada? Quando começo a escrever uma peça musical, sempre me inspiro no texto escrito, anotando minhas impressões e mapeando a narrativa da composição que está por vir. Palavra, texto, narrativa: são elementos cruciais na construção das minhas composições musicais”, explicou.
Para Robert Kirzinger, do Boston Globe, Pinto Correia escreve “música de impacto sonoro visceral, combinada com uma curiosidade eclética sobre o lugar da música no mundo e uma forte tendência em direção ao drama e ao teatro”.
Um exemplo é Pássaros da noite. “A peça inspira-se na tristeza partilhada pelo casal Robert e Clara Schumann na sua correspondência e numa carta a um amigo na qual Robert escreveu que ‘os melancólicos pássaros da noite ainda voam em volta de mim de tempos em tempos’”, anotou o crítico Joshua Barone no New York Times. “A obra é o relato de uma noite angustiante, em que cordas, em uma névoa de harmônicos, sustentam os gritos tristes de um trompete. Um conjunto de episódios noturnos, um sinistro arabesco de neblina. Como em qualquer noite de ansiedade sem dormir, a escuridão perdura, aparentemente interminável, até que desaparece.”
Em 2023, Pinto Correia estreou Reverdecer, seu concerto para violoncelo, na Fundação Calouste Gulbenkian, que encomendou a obra em parceria com a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo. “Reverdecer, palavra que encontrei múltiplas vezes em sermões religiosos do século XVII, contém no seu âmago duas possibilidades temporais. Por um lado, temos reverdecer como algo que cresce, renasce, se fortalece, e que olha para o além, para o futuro. Por outro, temos um reverdecer de memórias. Ou seja, uma nostalgia, um recordar, um recriar de um passado não necessariamente cronológico, mas uma reconstrução de memórias feita de acordo com a imaginação e as vivências individuais”, explicou a compositora no programa do concerto.
“A ideia de organizar gestos e blocos musicais em dois tempos simultâneos, em que passado e futuro fluem conjuntamente, está no centro deste concerto. A viagem musical do instrumento solista é assim feita entre estes dois tempos coexistentes, num estado temporal simultâneo entre passado e futuro. Através de uma linguagem musical própria, o violoncelo emerge e submerge do tecido orquestral com uma linguagem distinta da linguagem musical que o rodeia. Desta forma, o material musical vai sendo continuamente recriado, reverdecendo através de novas paletas orquestrais, cores, e timbres”, continuou.
“Reverdecer é dedicada à memória de meus pais. É uma viagem de emoções, recordações, saudade e esperança. Uma segunda dedicatória é para o extraordinário solista norte-americano Jay Campbell, com amizade e admiração, para quem a obra foi escrita, e com quem tenho colaborado nos últimos seis anos.
Roteiro musical
Reverdecer terá sua estreia latino-americana nos concertos da Osesp desta semana, nos dias 24, 25 e 26, sob regência de Thierry Fischer. O solista será Jay Campbell, também responsável pela estreia mundial, em Lisboa. O programa terá ainda obras de Heitor Villa-Lobos. Leia mais aqui.
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