Matriz de Tiradentes: pároco afirma que programação do órgão continua mesmo sem Elisa Freixo

Em resposta à organista Elisa Freixo, Pe. Álisson André Sacramento enviou mensagem à Revista CONCERTO defendendo nova organização
 
O novo pároco da Paróquia de Santo Antônio, Pe. Álisson André Sacramento, em Tiradentes, Minas Gerais, enviou uma carta à Revista CONCERTO com o pedido de “direito de resposta” em relação à notícia “Concertos semanais de órgão na Matriz de Tiradentes são cancelados”, publicada no Site CONCERTO em 12 de setembro. A notícia, que fala do cancelamento das atividades da organista Elisa Freixo em Tiradentes, teve grande repercussão no meio musical brasileiro e provocou a manifestação de muitos artistas em defesa da musicista.

A matéria tratava de um post em que os organistas Elisa Freixo e Thiago Tavares comunicavam a decisão de deixar o trabalho que vinham realizando nos últimos dez anos na Matriz de Santo Antônio de Tiradentes, onde promoviam concertos semanais de órgão. Segundo a organista Elisa Freixo, “devido a uma mudança de orientação na Matriz de Santo Antônio de Tiradentes, com a chegada do novo pároco, não podemos continuar com o formato de concertos semanais. Assim, nosso desligamento é necessário e nos leva a buscar outros locais para a sequência do projeto de concertos de órgão”.

Conforme a carta do Pe. Álisson, que em julho assumiu a Paróquia, “viu-se a necessidade de dar apoio aos músicos da cidade de Tiradentes e da região, que até então não tinham acesso ao órgão”. Ele segue: “Foram feitas reuniões com as partes interessadas, onde se estabeleceu um critério democrático no uso do órgão e que os concertos devem acontecer às sextas-feiras, quando não houver celebrações religiosas; além disso, organizou-se a quinta-feira e o domingo para os grupos. A senhora Elisa Freixo, por decisão própria, não quis integrar-se à esta nova organização, preferindo assim deixar as suas atividades na cidade de Tiradentes”, escreveu. O padre afirma que os concertos seguirão acontecendo “por músicos formados na técnica do uso de órgãos históricos”. [Leia a a mensagem na íntegra abaixo.]

O órgão da Matriz de Santo Antônio de Tiradentes é um dos mais importantes do país. Construído no Porto, foi inaugurado em 1788. Em 2009, passou por uma restauração supervisionada por Elisa Freixo. Desde então, Elisa Freixo, que é organista de projeção internacional, dirigia uma série semanal de apresentações que devolveu a Tiradentes a importância como centro de pesquisa e interpretação do repertório para órgão.

Leia abaixo na íntegra a mensagem do Pe. Álisson André Sacramento, pároco da Paróquia de Santo Antônio:

“Em fins do Século XVIII, com o grande movimento musical da Vila de São José do Rio das Mortes, e o florescimento de novos músicos, a Matriz de Santo Antônio necessitava de um órgão novo que servisse não só à Irmandade do Santíssimo Sacramento, “fabriqueira da igreja”, mas também às outras irmandades. Para adquirir um novo instrumento, as irmandades e pessoas benfeitoras cotizaram-se e, em 1785, foi feita a encomenda do órgão em Portugal. Manuel Jorge Ribeiro, homem de posses da antiga Vila de São José do Rio das Mortes, solicitou à Irmandade do Santíssimo Sacramento a quantia de 201,094 réis, que enviou a seu irmão, Domingos Jorge Ribeiro, residente na cidade do Porto-Portugal, para custear a compra dos “canudos” e mais miudezas para o órgão (SANTOS FILHO, p.141).

Domingos Jorge Ribeiro, acordou com Simão Fernandes Coutinho, a fabricação do instrumento pelo preço de 202.000 réis, enquanto a Irmandade recebia esmolas para financiar o resto das despesas.

É quase certo que o instrumento foi inaugurado em 1788, embora não tenhamos localizado o recibo. Francisco de Paula Dias, em 1790 foi contratado para tocar o órgão nas Missas da capelania da Irmandade do Santíssimo Sacramento realizadas todas as quintas-feiras, nas missas dominicais, nos dias santos e demais missas e festas promovidas pelas outras irmandades sediadas na Matriz.

A caixa que envolve o instrumento apoia-se em uma elegante e leve mísula em forma de pirâmide invertida, com arestas ornamentadas em talhas de motivos “rocailles”, arrematada na parte inferior com um “bouquet” de folhas de acanto, tudo no mais fino gosto rococó. A pintura e douramento da caixa e da mísula, são de autoria do mulato Manoel Victor de Jesus. A mísula, apresenta na frente, um painel representando o Rei Saul em seu trono, tendo na mão direita uma lança, com a qual tenta atingir Davi, que, de pé, à sua frente, tange uma harpa. Embaixo da cena bíblica, há um versículo do Salmo 150, que diz: “Laudate eum in tympano e choro, laudate eum in cordis e organo” que significa: Louvai a Deus com tímpano e coro, louvai a Deus com cordas e órgão.

Em 1977, por iniciativa da fundação Rodrigo Melo Franco de Andrade, foi proposta uma intervenção no órgão, com financiamento da empresa alemã DKVU. Para executar o serviço, contratou-se Manfred Tonius, da cidade de Nuremberg-Alemanha, que concluiu o trabalho em 1978. Nesta mesma época foi gravado um LP, tendo como organista o Professor André Pires.

Em 2004, a Paróquia de Santo Antônio e a Sociedade Amigos de Tiradentes – SAT – e o Santa Rosa Bureau Cultural uniram forças para restaurar o órgão. O processo de restauração começou em abril de 2007, durou 20 meses, sendo executado por duas equipes, uma estrangeira e outra nacional. As peças do instrumento foram transportadas para Barcelona, na Espanha, onde funciona a oficina do famoso organeiro alemão Gerhard Grenzing, após autorização de translado concedida pelo IPHAN. Em janeiro de 2008, as peças chegaram da Espanha e todas as partes do maquinário foram reconstruídas, obedecendo as técnicas utilizadas há 200 anos. Em agosto, as peças retornaram à Matriz de Santo Antônio; logo após vieram os organeiros para montar e afinar o instrumento. Em outubro, a comunidade voltou a escutar os acordes do órgão da Matriz. Paralelamente ao trabalho de restauro do instrumento, foi realizado o restauro da caixa que protege o órgão e da balaustrada do coro. O projeto também abarcou todas as viagens do organeiro e de sua equipe, o traslado das peças até Barcelona, onde se radicava o organeiro, a montagem e manutenção de um coro por um ano; concerto de reinauguração, e 24 concertos didáticos; material gráfico e dois audiovisuais gravados em CD. Em 7 de fevereiro de 2009, o órgão voltou a integrar efetivamente o cotidiano da cidade de Tiradentes. Este projeto foi custeado com dinheiro público, tendo o patrocínio da Petrobrás, no valor de cerca de 1 milhão de reais.

Desde então, a organista Elisa Freixo veio utilizando do órgão para concertos, posteriormente também a organista Maria Amélia Viegas. Com a mudança de pároco, ocorrida em julho do corrente ano, viu-se a necessidade de dar apoio aos músicos da cidade de Tiradentes e da região, que até então não tinham acesso ao órgão. Foram feitas reuniões com as partes interessadas, onde se estabeleceu um critério democrático no uso do órgão e que os concertos devem acontecer às sextas-feiras, quando não houver celebrações religiosas, além disso, organizou-se a quinta-feira e o domingo para os grupos. A senhora Elisa Freixo, por decisão própria, não quis integrar-se à esta nova organização, preferindo assim deixar as suas atividades na cidade de Tiradentes.

A organista Elisa Freixo nunca foi organista da Matriz de Santo Antônio, para as celebrações litúrgicas, como também não foi estabelecido nenhum contrato com a paróquia.

Portanto, os concertos não foram cancelados, pelo contrário, continuam acontecendo por músicos formados na técnica do uso de órgãos históricos. A partir de agora, teremos também a formação para novos músicos e abertura para organistas interessados, desde que apresentem um currículo que ateste a sua formação para um órgão como este. Além de disso, o seu uso litúrgico, como primeiro objetivo, continuará sendo realizado.

Como Pároco da Paróquia de Santo Antônio, de Tiradentes, afirmo o meu apoio à música, sobretudo à música sacra, em suas tradições religiosas, que há 300 anos vem sendo manifestadas nestas terras tiradentinas.

Pe. Álisson André Sacramento
Pároco da Paróquia de Santo Antônio, de Tiradentes

REFERÊNCIAS:
• SANTOS FILHO, Olinto Rodrigues. A Matriz de Santo Antônio em Tiradentes. Brasília-DF. IPHAN. Programa monumenta, 2010.
• TONI, Flávia Camargo. A música na Vila de São José e o Capitão Manoel Dias de Oliveira, 1985. Dissertação (Mestrado em artes). Escola de Comunicação e artes da Universidade de São Paulo.
• Memória do Restauro sobre a restauração do órgão da Matriz – 2008.”

[Edição em 19/09/2019, 9h15: Inclusão de “mesmo sem Elisa Freixo” no título da matéria.]

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