Aos dois anos de idade, a soprano Gabriela Geluda voltava de uma ida à padaria com seu pai quando um pastor alemão abocanhou sua cabeça.
O episódio, ela conta, acarretou uma série de traumas. E, em 2017, virou ponto de partida para uma ópera, Na boca do cão, com música de Sergio Roberto de Oliveira e libreto de Geraldo Carneiro.
A peça agora ganha uma versão audiovisual, filmada em março no Teatro Serrador, que será exibida pela internet nos dias 18, 23, 24 e 25 de abril. Os ingressos são gratuitos, mas devem ser adquiridos por aqui.
A ideia para a obra nasceu pouco depois da morte do pai de Geluda – e a estreia ocorreu semanas após a morte do compositor, vítima de um câncer.
Na ocasião, Geluda, especialista na criação contemporânea, falou do sentido da história. “A ópera nasceu do luto. É a flor de lótus: linda e que brotou na lama. Ela parte de um episódio pessoal e se torna um manifesto. Sim, a arte cura, a arte sublima, a arte liberta, a arte transforma e precisamos investir, valorizar, consumir, criar mais”, afirmou.
“No início dos ensaios, me dei conta de que o caminho da encenação residia na investigação profunda das memórias de Gabriela e que o espetáculo resultaria inevitavelmente de uma autoexposição corajosa e despudorada da intérprete”, afirmava em 2017 o diretor Bruce Gomlevsky, também responsável pela nova versão digital do espetáculo.
“Entendendo o trauma como ponto de partida da experiência de vida (com foco especial na ideia do desejo), a ópera flutua entre a narrativa dos acontecimentos e a reflexão sobre eles. Mas essa reflexão não é racional - parece fazer-se da intensidade quase física do sentimento, em diálogo com a música de Oliveira. A maneira como ele trata, em diferentes momentos, cada um dos instrumentos, em especial o caráter onírico sugerido pela percussão, esfumaça de maneira dramaticamente eficiente qualquer noção de linearidade. Estamos, afinal, falando de memória, de medos, de contradições e da necessidade, às vezes dolorosa demais, de transformação”, escreveu em 2017 o crítico João Luiz Sampaio sobre a obra.
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