“Quando leio sobre feminicídio, penso: mais uma Carmen que se foi”, diz Luciana Bueno

por Luciana Medeiros 08/06/2022

Cantora interpreta o papel em novo espetáculo no Theatro Municipal do Rio de Janeiro

A mezzo-soprano paranaense Luciana Bueno vê a luz, a alegria e a liberdade da cigana Carmen acima dos tons da tragédia de Mérimée que Bizet levou para a ópera. Nos dias 10 e 11 de junho, ela encarna novamente a sedutora sevilhana em um concerto cênico no Theatro Municipal do Rio de Janeiro.

O espetáculo integra a série Vozes 2022. Ao seu lado, formando o quarteto de protagonistas, estarão a soprano Flávia Fernandes (Micaela), o tenor Hélenes Lopes (D. José) e o barítono Vinicius Atique (Escamillo). A regência da OSTM é de Priscila Bomfim e há participação do coro do teatro carioca e da bailarina de flamenco Chris Aguiar.

“Minha Carmen é solar, cheia de vida”, reforça Luciana, em conversa com a CONCERTO nas vésperas da estreia. “Não está presa a ninguém, faz o que quer e por isso incomoda uma sociedade em que a mulher é submissa."  A mal-recebida estreia da ópera, na Paris de 1875, talvez já revelasse o desconforto frente ao que a heroína representa, transgressões que até hoje parecem justificar o fim da personagem.

“A tragédia final é muito triste. A cada vez que leio sobre um feminicídio, penso: mais uma Carmen que se foi”, ressalta a mezzo. “O castigo pela liberdade, pela autenticidade, que mulheres ainda sofrem por parte de homens inseguros, neuróticos, que não conseguem lidar com a frustração. Acontece até hoje, deve estar acontecendo nesse minuto.” 

Apaixonada pela personagem, de longe a mais constante na sua carreira, Luciana defende o bom-gosto da música de Bizet. “É uma obra-prima. A música é considerada, às vezes, estereotipada, mas é elegante e traz o cromatismo tão em moda na época, um estilo que valoriza o exotismo que ele repete no orientalismo de Os Pescadores de Pérolas, por exemplo.”

A oposição das figuras femininas no palco se dá com a doce Micaela, de tranças juvenis e recato. “Mas Micaela não é uma bobinha frágil, não”, considera a mezzo-soprano. “É corajosa e determinada. Quer afastar D. José daquela chave de cadeia e ficar com ele!”, ri. Suas Carmens referenciais são diversas – “adoro certas montagens por motivos diferentes: as vozes, a cena, a pulsação. Lembro, num primeiro momento da Carmen no Covent Garden com Maria Ewing e Luis Lima e da montagem com Agnes Baltsa e José Carreras no Metropolitan Opera.”

Flávia Fernandes, que encarna Micaela nesse concerto, concorda que sua personagem vai atrás do destino que lhe cabe, mesmo como uma figura tradicional de mulher. “Isso está na música, que traduz a doçura de Micaela." Ela não hesita um segundo sequer para nomear sua maior referência para o papel: “Mirella Freni, sem a menor dúvida!”.

Carmen estreou no Municipal do Rio em 1913, poucos anos depois de sua inauguração. Sucesso de público, continua sendo uma das montagens mais frequentes da casa, incluindo uma das passagens de Mario Del Monaco pelo Brasil, ao lado de Giulietta Simionato, nos anos 1950. Além da tradução do texto projetada, o espetáculo contará com a narração da bailarina Ana Botafogo pontuando os principais acontecimentos do enredo.

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A mezzo soprano Luciana Bueno [Divulgação/Gabriel Lehto]
A mezzo soprano Luciana Bueno [Divulgação/Gabriel Lehto]

 

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