Bons compêndios de história da música são menos numerosos do que gostaríamos. Existem bons manuais voltados para o público especializado, livros volumosos feitos mais para consulta regular do que para leitura contínua. Para o público leigo ou apenas não profissional da música, sobram poucas opções; muitas delas, a despeito de procurarem uma forma amigável de introduzir o tema, acabam por ser superficiais – quando não cheias de erros.
Tudo isso me veio à mente quando me deparei há pouco tempo com Linguagem do espírito: uma introdução à música clássica, de Jan Swafford. Lançado originalmente em 2016, foi editado no Brasil no ano passado pela Zahar. Nenhuma das definições do parágrafo anterior se aplica à obra. O livro de Swafford é uma ótima opção para introduzir qualquer um no universo da música clássica, mas é ao mesmo tempo uma ferramenta útil para professores e pesquisadores.
Compositor, professor e musicólogo, Jan Swafford é conhecido por estudos densos, principalmente biografias de referência sobre alguns compositores, como Beethoven. Na esclarecedora introdução do livro, ele reconhece que essa obra tem outro tipo de abordagem: é uma “introdução ao que chamamos de música clássica, suas principais figuras, sua influência e seus principais períodos. Pretende ser um incentivo aos que desejam compreender esse tipo de música”.
Um trunfo da obra é a qualidade do texto. Rico, equilibra leveza e profundidade, alternando informações históricas e técnicas com muita fluidez
Não há nada de inovador na estrutura e abordagem do livro, que se divide em cinco partes: “Os primeiros anos”, “Barroco”, “Classicismo”, “Romantismo” e “Modernismo e além”. A primeira é obviamente a parte mais curta, com um capítulo dedicado aos primórdios da música até a Idade Média e outro devotado à Renascença. Da segunda parte em diante, há sempre um capítulo introdutório e outros dedicados a compositores específicos. Por exemplo: a parte IV se inicia com “O período romântico (1830-1900)” e tem capítulos dedicados a Berlioz, Liszt, Brahms etc.
Como tem o objetivo de ser uma obra introdutória, isso não é um problema, e faz bastante sentido. “Muito do que é apresentado aqui tem sido, durante séculos, de conhecimento comum, tanto em relação aos músicos quanto a seu público. Tenho certo respeito pelo conhecimento comum: ele nunca chega longe o bastante, mas costuma ser comum por uma boa razão”, justifica o autor.
Um trunfo da obra é a qualidade do texto. Rico, equilibra leveza e profundidade, alternando informações históricas e técnicas com muita fluidez – como quando, por exemplo, dá uma explicação detalhada e ao mesmo tempo didática do gênero fuga ao tratar do período barroco. Outro trunfo é fazer o livro dialogar com a internet e suas muitas possibilidades. Swafford sugere a audição de obras enquanto fala de um gênero musical ou discute um autor, e estimula que o leitor pare e vá buscar a peça no streaming, para um melhor entendimento daquilo que está sendo dito. E, se o leitor-ouvinte se empolgar com determinado compositor, que vá à Wikipédia, navegue, continue pesquisando por conta própria.
Mas por que chamar o livro de “Linguagem do espírito”? A resposta parece estar também na introdução: “Ao contrário das biografias musicais que escrevi, esta não é uma obra de intenção erudita. Ela se fundamenta principalmente numa motivação específica, aquela que me atraiu para a música clássica desde o início e a razão pela qual ainda sou compositor e escritor: prazer e emoção”.
De fato, Jan Swafford parece escrever tendo sempre em mente aquela primeira chama que a música lhe despertou na meninice, quando se interessou por ela mais do que por outras artes ou assuntos. É sem dúvida uma forma eficiente de envolver o leitor. “Esse livro é uma canção de amor à arte que eu amo e à qual dediquei minha vida”, afirma ele.
[O livro 'A linguagem do espírito', de Jan Swafford, está disponível na Loja CLÁSSICOS; clique aqui]
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