Recital mais intimista revela imensa estatura artística da mezzo soprano norte-americana
Para começar, é preciso registrar a excepcional qualidade vocal da mezzo soprano Isabel Leonard. Seu timbre acobreado e luminoso percorre com homogeneidade toda a extensão do registro vocal, e em todas as regiões projeta um núcleo sonoro vigoroso e de grande intensidade. Musicalidade inata se mescla a uma incrível técnica, com vibratos cuidadosamente controlados, dicção clara e tudo isso com grande naturalidade, como se fosse a coisa mais simples do mundo... Não é surpreendente, portanto, que Leonard seja uma das cantoras mais solicitadas da atualidade, com a agenda tomada por alguns dos principais teatros de ópera do mundo.
E foi assim – vocalmente impressionante! – a apresentação da artista na noite de ontem, dia 8 de agosto, na Sala São Paulo, acompanhada pelo pianista Bryan Wagorn, em promoção da Dellarte (a dupla ainda faz recital amanhã, dia 10, no Theatro Municipal Rio de Janeiro). Mas não foi só isso, o recital foi muito mais! Leonard interagiu com a plateia e conquistou-a também por sua simpatia e graça.
Isabel Leonard é nascida nos Estados Unidos, mas é fluente em espanhol – “mi família mora en Santiago, pero mi mamá es argentina, de Buenos Aires, verdadera porteña!”, disse, animada e entre risadas. E o programa variado, apresentado despretensiosamente – mas com bom gosto e em alto nível –, resultou em um espetáculo leve, prazeroso e emocionante. Não foram poucas as pessoas que estiveram com lágrimas nos olhos no bis final – que era a singela canção Over the Rainbow do musical Mágico de Oz...
O programa iniciou com Clavelitos do compositor espanhol Joaquín Valverde (1875-1918). Seguiram-se canções populares recolhidas pelo poeta Federico Garcia Lorca (1898-1936), sempre com o equilíbrio exato entre a técnica erudita e a entoação popular. O ponto focal da primeira parte ficou reservado para uma interpretação repleta de nuanças das Cinco canciones negras do compositor catalão Xavier Montsalvatge (1912-2002).
O programa seguiu, na segunda parte, com repertório francês. Após o Clair de Lune de Debussy para piano solo, Leonard cantou o ciclo de canções Sheherazade, de Maurice Ravel (1875-1937), originalmente composto para orquestra e voz e estreada em 1904. Foi muito bom!
Veio então a famosa ària Près des remparts de Séville da ópera Carmen, de Georges Bizet (1838-1875). Antes de cantar, Leonard contou, em segredo (“fica entre nós, não devo falar nada ainda”), que fará Carmen no Metropolitan Opera House a partir do ano que vem (“se alguém de vocês for lá assistir, não deixe de me procurar”).
Sempre bem-humorada, seguiram-se ainda duas cenas da opereta La Périchole, de Jacques Offenbach. Primeiro, a divertida ária da embriaguez, seguida então da resignada confissão de amor.
Não é a primeira vez que ouvimos Isabel Leonard em São Paulo – ano passado, pela temporada do Mozarteum, ela já tinha entusiasmado o público, acompanhada então pela Orquestra Acadêmica Mozarteum (clique aqui para ler a crítica de Irineu Franco Perpetuo). Ontem pudemos ouvi-la em um recital mais próximo e intimista, em que se revelou ainda mais a sua imensa estatura artística.
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