‘Madama Butterfly’: um testemunho

por Jorge Coli 01/10/2019

Quero deixar aqui um testemunho. Trata-se da apresentação de Madama Butterfly, produzida pela Cia. Ópera de São Paulo, ou seja, por Paulo Esper, um apaixonado que busca, de todos os modos, fazer ópera. Ela estreou em Americana, no último dia 26, e está circulando por Araras e São João da Boa Vista. Será reapresentada em São Paulo, Santo André e Jacareí nos meses de outubro e novembro.

Meu testemunho vem de dentro, e não de fora, porque Esper, maluco, permitiu que eu realizasse a encenação dessas montagens. Não escrevo como crítico.

Quero dizer apenas como me recarreguei de energias, graças à companhia de um elenco jovem, entusiasta, talentoso e com belas vozes. O papel título coube a Marly Montoni: já expressei nesta revista, várias vezes, meu entusiasmo por sua arte para dizer que ela dominou o personagem, tanto do ponto de vista cênico quanto vocal. É o soprano que sustenta, primordialmente, essa ópera, e Marly Montoni com segurança e intensidade, ofereceu uma Cio-Cio-San da mais alta categoria.

Os outros (e quero assinalar a grande qualidade de todos) deram a ela um suporte condigno, vibrante e muito musical:  Fernando Castro (tenor) no papel de Pinkerton, Tomás David (barítono) como Sharpless, Catarina Taira (mezzo) como Suzuki, Ulisses Montoni (Goro), Gustavo Lassen (Tio Bonzo), Marcus Ouros, Marcelo Mesquita, Cristiane Mesquita e Alex Meister. Alegria de ver uma nova geração de cantores despontando. Cito ainda, porque foi adorável, a participação do menino Thales Muller Staufaker no papel do filho de Butterfly.

Foto da produção da ópera ‘Madama butterfly’, de Puccini [Divulgação]
Foto da produção da ópera ‘Madama butterfly’, de Puccini [Divulgação]

Trabalhar com Giorgia Massetani, que se afirma, cada vez mais, no Brasil, devido ao seu trabalho de cenógrafa, foi uma honra e um grande prazer, assim como com a Casa da Malonna, que fez as maquiagens e as perucas; com o iluminador Douglas Chinaglia, com o inacreditável diretor de palco Willian Nunes, um azougue que não parava até ficar tudo perfeito; com o excelente pianista preparador, maestro Edson Pisa; e com o coordenador geral Alberto Marcondes. Lembro ainda os diálogos que pude ter com Maria Rasetti, que participou da produção e que, em especial, cuidou da tradução impecável para as legendas.

Nesta rodada do mês de setembro, a Orquestra de Americana, sob a regência cuidadosa de Álvaro Peterlevitz, encarregou-se das récitas. O papel das orquestras nas cidades do interior é essencial para a formação de um público que admire a música clássica, e a Orquestra de Americana, com seu maestro, vem cumprindo esse papel.

Nas récitas de outubro e novembro (Santo André, dias 19 e 26; São Paulo, no Teatro Sérgio Cardoso, dias 25 e 27; e em Jacareí, dias 2 e 3), a regência estará nas mãos de Abel Rocha. Ele é maestro de grande classe, muito experiente no campo do teatro musical e da ópera. Encarregou-se da preparação do coro e dos cantores desde o início dos ensaios, com inteligência, rigor e precisão. Conduzirá “sua” orquestra, ou seja, a de Santo André, para todas essas récitas. E, nelas, o tenor Paulo Paolillo abraçará o personagem de Pinkerton, alternando com Fernando Castro.

Estive presente na apresentação de estreia, em Americana. Teatro cheio, com quase 700 pessoas: um público muito caloroso. Entre eles, três alunas minhas da Unicamp, bem jovens, vieram me dizer que, pela primeira vez, assistiam a uma ópera ao vivo. Estou seguro que essa turnê vai revelar, para muita gente, o que é uma ópera, e só por tal razão, Paulo Esper tem extraordinário mérito. Inda mais que faz tudo isso com um orçamento baixíssimo.

Quanto à minha montagem, digo apenas que propus uma Madama Butterfly anticolonialista.

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