Concerto teve regência do maestro titular Rodrigo Toffolo e solos do clarinetista Ovanir Buosi
Foi um prazer assistir ao concerto da Academia Jovem da Orquestra Ouro Preto, no domingo dia 11 de agosto, na Sala São Paulo, na série dos Concertos Matinais. Sob direção do maestro Rodrigo Toffolo, os cerca de 30 instrumentistas bolsistas tocaram com competência e disposição. A orquestra soou bem, caprichando nos timbres e nas articulações, realçando os diálogos contrapontísticos, sempre com atenção, precisão rítmica e musicalidade. E os bonitos solos do spalla e das primeiras estantes também deram mostra da qualidade dos jovens instrumentistas, todos eles com idade entre 18 e 28 anos.
No concerto, o grupo lançou o seu primeiro CD e o repertório apresentado foi exatamente o gravado: de Gustav Holst, a Suíte Saint Paul op. 29 nº 2; de Bartók, as Danças populares romenas; os Três momentos para cordas e percussão de Nelson Ayres; e, de Alexandre Travassos, a Fantasia para clarinete e orquestra (o CD já pode ser ouvido no spotify – clique aqui para acessar).
As obras dos brasileiros Nelson Ayres (1947) e Alexandre Travassos (1970) são encomendas escritas especialmente para a Academia Jovem da OOP. Ayres é conhecido e admirado como um dos principais nomes do que se convencionou chamar de música instrumental brasileira, com trabalhos antológicos. Com seus Três momentos para cordas e percussão, Ayres mostra também grande domínio do “erudito” criando música pura e sensível, de grande inventividade. São movimentos bem construídos, que exploram com brilhantismo a essência da linguagem musical.
Já a obra de Travassos, igualmente cativante, tem uma proposta mais programática. Ela é baseada no cordel “A morte do bode Tião”, que conta causos que aconteceram em João Pessoa – o subtítulo do cordel é “o dia em que o Bode Tião explodiu: porque bicho ruim não morre, espalha!”. Escrito por Jefte Amorim sobre argumento de Mateus Freire, a história fala justamente do bode “que chamavam de Tião / Era já um bode velho / Tinha aquele barbichão / Pense num bicho fedido / E ranzinza feito o cão!”...
Travassos compôs uma inspirada fantasia para clarinete, que teve como solista o excelente Ovanir Buosi, primeiro clarinete da Osesp. A música narra as aventuras do bode danado e malquisto, que se empanturra de farinha e finalmente explode, em uma escrita expressiva e com ritmos nordestinos.
Sem medo de mesclar a rica tradição popular brasileira com o universo clássico, o álbum da Academia Jovem é mais uma valiosa contribuição cultural do excelente trabalho desenvolvido pela Orquestra Ouro Preto. Pois ali, clássico e popular andam de mão juntas, sempre sob o guarda-chuva da qualidade.
Senão, vejamos alguns exemplos do amplo e rico leque artístico desenvolvido pelos projetos da Orquestra Ouro Preto: o ótimo CD Haydn Mozart com a participação de solistas do calibre dos pianistas Cristian Budu e Gustavo Carvalho; a ópera encomendada a Tim Rescala baseada no Auto da compadecida de Ariano Suassuna, que foi apresentada em diversas cidades do Brasil (leia mais aqui); suas séries com arranjos sinfônicos com música de Alceu Valença (leia mais aqui); ou ainda a ópera O grande governador da Ilha dos Lagartos, de António José da Silva, o “judeu”, que montaram em 2019 no mais antigo teatro em operação da América do Sul, a Casa da Ópera de Ouro Preto (leia mais aqui). Aliás, a ópera foi o primeiro projeto da Academia Jovem da Orquestra Ouro Preto, que neste ano está completando 5 anos de atividades.
A Orquestra Ouro Preto, que foi fundada no ano 2000 e que desde 2007 tem direção artística de Rodrigo Toffolo, é um projeto mantido pelo Instituto Ouro Preto, uma entidade de direito privado sem fins lucrativos. Eu acho uma beleza ver um projeto independente desenvolvendo com sucesso um trabalho criativo e diversificado como esse, que certamente enriquece o ecossistema clássico brasileiro e contribui de forma determinante para a democratização da atividade musical de qualidade no Brasil!
P.S.: No fim de agosto, a Orquestra Ouro Preto faz dois concertos no Theatro Municipal do Rio de Janeiro: dia 28, apresenta um espetáculo ao lado do multiartista Antonio Nóbrega; e no dia 29, a OOP fará o concerto “The Beatles”, sucesso de seu repertório.
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