Texto de Camila Fresca na Revista CONCERTO de junho de 2010
Robert Schumann nasceu em 8 de junho de 1810 em uma pequena cidade da Saxônia (Alemanha) chamada Zwickau. Filho de um livreiro e de uma talentosa pianista amadora, tinha quatro irmãos e desde cedo mostrou talento para o piano e a composição, bem como pendores literários. No colégio fundou uma orquestra e uma sociedade de letras, e em casa estava sempre tocando piano. Durante a adolescência – quando gostava que o chamassem de “Faust” ou “Doppelgänger” (duplo espiritual), em alusão ao universo de Goethe e de Schubert – sofreu fortes abalos emocionais com o suicídio de Émile, sua única irmã, e um ano depois, com a morte de seu pai – Schumann tinha então 16 anos. Foi também durante a adolescência que ele acumulou vasta cultura literária e musical, produzindo algumas peças para piano, assim como textos literários.
Em 1828 Schumann muda-se para Leipzig para estudar direito, persuadido pela mãe a seguir uma carreira rentável e segura. Após um período em Heidelberg, convence a família de que quer seguir a música. Volta para Leipzig em 1830 e torna-se aluno de Friedrich Wieck, famoso professor e pai da jovem Clara, pianista prodígio aos onze anos. Surge então para Schumann o dilema entre ser um virtuose do piano ou um compositor, e os esforços desesperados para desenvolver a técnica pianística acabam por prejudicar seriamente dois dedos da mão direita. O piano, no entanto, seria o primeiro instrumento ao qual o artista dedicaria sua energia composicional.
Durante a década de 1830, escreveu grande parte dos ciclos hoje célebres, como os Estudos sinfônicos op. 13, Carnaval op. 9, Cenas infantis e Kreisleriana. Ao mesmo tempo, em um período de intensa atividade – continua a estudar piano com Wieck e é aluno de composição de Heinrich Dorn –, Schumann coloca seus pendores literários a serviço da música. Em 1831, trabalha como redator do periódico Allgemeine Musikalische Zeitung, no qual um de seus primeiros artigos (naquele momento considerado bastante explosivo) foi dedicado a revelar o jovem Chopin. Três anos mais tarde, funda sua própria revista, a Neue Zeitschrift für Musik.
Como crítico, mostrou-se brilhante e perspicaz, e seus textos incorporaram os aspectos mais progressistas do pensamento musical da época, além de revelar muitos e promissores compositores. Em diversas ocasiões fazia entrar em cena os personagens Eusebius, representando seu lado lírico e contemplativo, e Florestan, o lado fogoso, impetuoso. Com tais pseudônimos assinava artigos (e também obras) apaixonados e combativos.
Foi ainda durante a década de 1830 que Schumann viveu anos de aflição e espera pelo amor de Clara Wieck. O pai da moça fez o que pôde para separá-los, e o casal comunicava-se apenas por meio de cartas secretas. Em 1837 assumem um compromisso às escondidas e, em 1839, tomam medidas legais que tornam desnecessário o consentimento de Wieck. Todo esse processo faz com que Schumann passe por depressões profundas. Vencendo as diversas dificuldades, no entanto, o casal consegue oficializar a relação em 1840. Nesse mesmo ano, Schumann escreveu nada menos que 138 dos seus 248 Lieder – incluindo alguns de seus melhores ciclos, como o Amor do poeta.
Provavelmente essa produção foi motivada pelas alegres perspectivas trazidas pelo casamento. Sobre o ano de 1841, Schumann escreve em seu diário: “Poucos acontecimentos, felicidade plena”. É certo que se referia ao contentamento que a união com sua amada Clara lhe trazia – e que lhes renderia uma extensa prole de treze rebentos. Porém, a verve criativa do compositor não cessou e ele voltou-se para a música orquestral, escrevendo sua primeira sinfonia e iniciando a segunda, além de compor a Fantasia para piano e orquestra, dedicada a Clara e que em 1845 tornou-se seu admirado Concerto para piano op. 54.
Com a mesma paixão com a qual se dedicara ao Lied e à música sinfônica, Schumann mergulha na composição de obras de câmara em 1842. A intensa febre criadora rende-lhe, em cinco semanas, a composição dos três quartetos de op. 41, seguindo com o Quinteto com piano op. 44 e o Quarteto com piano op. 47. A música de câmara estaria dali em diante entre suas principais preocupações.
No ano seguinte concentrou-se na música coral e musicou parte do Fausto, de Goethe, o que lhe custou tremendos esforços físicos e mentais (as Cenas de Fausto só seriam concluídas em 1853). Também assumiu um cargo de professor no novo Conservatório de Leipzig, mas foi criticado tanto como docente quanto como regente. Em 1844, exausto após acompanhar Clara Schumann em uma turnê pela Rússia (e sofrendo por estar relegado ao segundo plano), o compositor abandona a direção da revista e decide mudar-se de Leipzig. Instala-se em Dresden e a partir de então sua saúde deteriora-se progressivamente.
Ainda assim, Schumann produziria obras importantes: concluiu sua segunda sinfonia em 1846 e entre 1847-8 escreveu Genoveva, sua única ópera. Em 1850, instalado em Düsseldorf, compôs o eloquente Concerto para violoncelo e a Sinfonia nº 3, “Renana”. Embora bem recebido na cidade, Schumann logo foi contestado como regente de orquestra – havia sido contratado como diretor de música municipal. A situação agravou-se a ponto de ele ser demitido em 1852. Já bastante angustiado e perturbado, o músico escreve uma de suas últimas obras, os Cantos da alvorada op. 133, em 1853, mesmo ano em que encerra sua atividade crítica. Iniciada com o barulhento artigo sobre Chopin, a carreira de crítico musical termina com outro retumbante artigo. Em “Novos caminhos”, um Schumann já bastante doente aponta um jovem compositor que se tornaria outro gênio: Johannes Brahms.
Em 1854, ano no qual Brahms e o violinista Joachim organizam um festival em sua homenagem, Schumann passa a ter alucinações e delírios, sentindo ouvir obsessivamente uma única nota. Pediu para ser internado, o que só aconteceu depois de tentar o suicídio. Foi levado para o asilo de Endenich, perto de Bonn, onde viveu ainda dois anos, falecendo em 28 de julho de 1856, ao que tudo indica em consequência de sífilis.
Linha do tempo
1810
Nasce em Zwickau, Alemanha
1826
Perde o pai aos 16 anos
1828
Vai para Leipzig cursar direito e envolve-se em atividades musicais
1830
Abre mão da carreira de advogado em favor da música; ao longo dessa década, compõe obras importantes para piano como Kreisleriana e Cenas infantis
1834
Já atuando como crítico, funda o periódico musical Neue Zeitschrift für Musik
1840
Embora com a oposição do pai da noiva, que era também seu professor de composição, Schumann casa-se com Clara Wieck
1841
Escreve sua primeira sinfonia
1847-1848
Escreve sua única ópera, Genoveva
1854
Começa a ter alucinações e interna-se em um asilo
1856
Falece no dia 28 de julho, ao que tudo indica, em consequência de sífilis