Morreu nesta sexta-feira em São Paulo, aos 72 anos, o pianista, compositor e pesquisador Achille Picchi. Com uma carreira dedicada em especial à música brasileira, ele contribuiu para a ampliação do conhecimento a respeito do repertório de canções, além de ter resgatados obras como a ópera Joanna de Flandres, de Carlos Gomes. Seu velório será realizado hoje, das 16h às 22h, no Funeral Home, na Rua São Carlos do Pinhal, 376.
Achille Picchi era bacharelado em piano e letras, mestre em educação pela Universidade de São Paulo e doutor pela Unicamp. Realizou sua carreira docente no Instituto de Artes da Unesp, onde foi professor de análise e composição. Ainda durante a sua formação, estudou piano com Antonio Bezzan e regência com Henrique Gregori.
Mais tarde, no início dos anos 1980, já tendo trabalhado como pianista e regente, inclusive estreando obras de autores brasileiros, Picchi procurou Camargo Guarnieri em busca de aulas de composição. Em entrevista publicada no trabalho de Ana Lucia Kobayashi sobre Guarnieri, ele contou que teve contato com a proposta estética do professor, entendendo as nuances com que ele lidava com a ideia de música brasileira, diferente, por exemplo, da de Villa-Lobos. Ainda assim, com o tempo, Picchi acabou se afastando da necessidade de escolha de um caminho estético único.
A experiência influenciaria em seu trabalho como professor, em instituições como a Unesp. “Eu não dou aulas de composição, eu dou aulas para compositores”, explicou na mesma entrevista. “Eu trabalho tecnicamente. Eu sempre falo que o compositor é um artesão. É um sujeito que faz uma cadeira e ela tem que ser muito bem feita, não pode quebrar, tem que ser confortável e tem que saber todas as maneiras de se fazer uma cadeira. Agora, se a cadeira fica bonita, depois famosa por alguma razão, e se for para um museu e ganhar prêmios, isso é outra coisa. A avaliação estética não me concerne no trabalho como compositor.”
A aceitação da diversidade marcou também seu trabalho como intérprete, seja no Trio Images, que formou ao lado da violinista Cecilia Guida e do violista Henrique Muller, seja como pianista ou então nas parcerias que estabeleceu com artistas como a soprano Martha Herr, a mezzo soprano Anna Maria Kieffer ou o violoncelista Zygmunt Kubala, entre tantos outros. Como compositor, ele se dedicou também a uma multiplicidade de gêneros: escreveu sinfonias, um importante número de canções, além de peças para piano e outros instrumentos, como o violão.
O trabalho acadêmico rendeu pesquisas sobre o repertório nacional, como a análise das Serestas, de Villa-Lobos (tema de seu doutorado) e das canções de Lorenzo Fernandez e Alberto Nepomuceno; da obra para piano de Alexandre Levy. Ele também trabalhou na recuperação, revisão e edição da ópera Joanna de Flandres, de Carlos Gomes, em seguida encenada no Teatro Alfa, em São Paulo. De Gomes, ele também gravou todas as canções reunidas por Niza de Castro Tank no livro Minhas pobres canções
O interesse pela voz era evidente em sua atividade e, por conta disso, as canções tiveram presença marcante no seu trabalho como intérprete e pesquisador. Mais do que isso, em seus textos estabelecia um panorama histórico que ia desde a ideia do canto como ferramenta expressiva até os múltiplos desenvolvimentos do cancioneiro ao longo dos séculos. Também desenvolveu um método de análise para ser empregado no contato com as canções brasileiras.
Entre seus livros, está Sinfonia Plural, de certa forma uma síntese de sua capacidade de reflexão sobre o fazer musical, em seus diversos contexto e facetas, motivado tanto por sua atuação no palco como na sala de aula. Nele, Picchi compila uma série de ensaios e artigos. A maior parte dos textos surge justamente dos múltiplos interesses do autor entre a música – sua preocupação maior e foco de sua atividade profissional – e a filosofia, tanto em seu sentido formal na tradição literária como em sua própria vida.
Entre os assuntos que Picchi abordava, em sua prosa acessível e fluida, destacam-se os ensaios “Diabolus in musica: a música e os padres jesuítas no alvorecer do Brasil”; “Almeida Prado, um compositor eclético”; “Alexandre Levy: paradigmas românticos e nacionalismo musical”; “Interpretação musical: uma aforismática interpretativa”; “Pianismo: escrita e escritura”; “A imagem e as mil palavras”; e “Música e conceito”. A obra trazia ainda o estudo “Mário Metaprofessor de Andrade”, texto crítico sobre o famoso “Ensaio sobre a música brasileira”, do século passado, por Mário de Andrade, escritor e estudioso da cultura brasileira.
![O maestro, pianista e professor Acchille Picchi [Divulgação]](/sites/default/files/inline-images/w-acchile.jpg)
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Comentários
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Grande perda! Músico…
Grande perda! Músico incrivel! Meus sentimentos aos familiares