Quando me deparei com a chamada de capa da muito importante revista francesa Opéra Magazine fiquei emocionado: “Bruno de Sá, o sopranista vindo do Brasil”.
Lembro-me dele, nos tempos da fabulosa era Luiz Fernando Malheiro no Theatro São Pedro de São Paulo: muito jovem, com voz admirável e um sentido musical perfeito. Depois de sua experiência ali, Bruno de Sá mudou-se para a Europa, onde sua carreira brilha cada vez mais.
Opéra Magazine consagrou-lhe duas páginas de entrevista, por ocasião de seu primeiro recital em disco, Roma Travestita, a ser lançado pela Warner Classics, e celebrou o fato de que “a carreira de um dos artistas mais promissores do momento decola”.
Fez também uma biografia sublinhando o papel de sua formação no Brasil: “Nascido em Santo André, no subúrbio de São Paulo, no dia 29 de novembro de 1989. Iniciou sua carreira profissional quando ainda era estudante em São Paulo, em 2013 onde, dois anos depois, aborda o papel de Sesto (La clemenza di Tito) no Theatro São Pedro. Arrebata, em 2016, o Primeiro Prêmio, o Prêmio do Público e o Prêmio Festival de Manaus no Concurso Brasileiro de Canto Maria Callas. Na Europa, integra, em 2019, a trupe de jovens artistas do Teatro da Basiléia (Theater Basel). Entre suas produções recentes mais marcantes: Carlo II il Calvo, de Porpora (Bayreuth, 2020 & 2021) e Il primo homicidio de Scarlatti (Salzburg & Montpellier, 2021)”.
Alguns trechos de sua entrevista:
(Sobre o revival de Allessandro nell’Indie, no dia 7 de setembro, em Bayreuth): "Como em sua criação, em 1730, Alessandro nelle Indie será interpretado por uma distribuição inteiramente masculina. Eu cantarei o papel de Cleofide – papel muito tenso nos recitativos, muito menos nas árias, o que não é habitual – numa montagem de Max Emanuel Cencic. Lamento apenas que, para ser verossímil em Cleofide, tenha que raspar minha barba!”
O jornalista pergunta: “Você se prestaria a cantar Giulietta em cena, diante de um Romeo feminino? [Na ópera de Bellini, os dois papéis são destinados a mulheres.]
"Sem dúvida! Penso até que seria um conceito extraordinário, inteiramente no clima dos dias de hoje, que interroga a fluidez dos gêneros e sua não-compartimentação. Acho o mundo lírico muito conservador e hipócrita: acham normal que uma mulher cante um papel de homem, mas o contrário parece impossível, ou aceitável apenas num contexto ridículo ou paródico. Mas em que seria absurdo que um soprano masculino cante um papel de mulher não escrito para um castrato? Nossa época gosta de enfiar os indivíduos em compartimentos, as justificações apresentadas são a tradição, ou a intenção do compositor, mas é claro que se trata apenas de preconceitos sexistas. Para mim, todo artista que disponha das capacidades vocais exigidas por um papel tem direito de cantá-lo, sem consideração de gênero. Em Mozart, por exemplo, não vejo diferença alguma entre as partes escritas para castrato e para soprano feminino. Veja o moteto Exultate, Jubilate, que todas as mulheres cantam: foi, entretanto, estreado por Venanzio Rauzzini, o primeiro Cecilio (Lucio Silla), e ninguém diz nada contra isso! Ao lado de Sesto, Cecilio e Idamante (Idomeneo), que eu já cantei, eu estaria perfeitamente interessado por Pamina (Die Zauberflöte), a Condessa Almaviva (Le nozze di Figaro) ou Despina (Cosi fan tutte). Resta saber que teatro me proporia esses papéis... Uma coisa é certa: se eu me lançar num deles, farei com toda a seriedade exigida, trazendo minha cor particular, mas também minha sensibilidade e minha emoção. Não quero ser tomado por um monstro de circo!”
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