Ópera: a manifestação artística do século XXI

por Redação CONCERTO 12/08/2024

Segundo Fórum Mundial da Ópera, realizado em junho em Los Angeles, EUA, mostrou a força e importância do gênero na atualidade

Por Flavia Furtado* 

A cidade de Los Angeles, nos Estados Unidos, recebeu entre os dias 3 e 5 de junho a segunda edição do World Opera Forum (Fórum Mundial da Ópera). Com mais de 750 participantes de 33 países de todos os continentes, o encontro mostrou a força e a abrangência, no século XXI, de um gênero artístico que já tem 400 anos de história.

O setor se reuniu pela primeira vez em 2018, em Madri, na Espanha, discutindo temas importantes como diversificação do público, novos títulos e financiamento. Desde então, o mundo atravessou uma pandemia global que fechou todos os teatros e afetou todas as áreas sociais, estando as atividades culturais entre as mais atingidas.

Desta forma, estarmos todos juntos novamente, passados seis anos, e constatarmos a vivacidade da produção operística no mundo todo, com novos teatros sendo abertos, composições contemporâneas sendo encenadas ao lado do repertório clássico, plateias se renovando, teve um significado especial.

O fórum deste ano não poderia deixar de tocar em alguns dos temas do primeiro encontro, que são pautas sempre fundamentais. No entanto, enquanto naquela ocasião o setor olhava para dentro e tinha a necessidade óbvia de alinhar discursos e visões internas, ficaram claros nesta segunda edição um olhar voltado para o mundo ao redor da ópera e a atenção aos diálogos que ela estabelece com a sociedade. 

São percepções fundamentais na contemporaneidade, que trouxeram questões como a relevância dos teatros de ópera no século XXI, o que está sendo produzido no mundo, como e para quem a ópera está sendo produzida, como e por quem está sendo consumida e como o gênero pode contribuir para elevar valores humanos e de cidadania.

Assim como qualquer outra manifestação cultural da atualidade, a ópera é também atravessada neste momento por pautas de gênero, raça e meio ambiente, que atualmente são transversais ao conjunto social

Isso pode se dar de maneiras significativamente diferentes entre os países e continentes, que vivem realidades culturais diversas. Enquanto a Europa traz séculos de tradição e repertório e por isso busca a inovação em muitos teatros, a Ásia surge como nova fronteira, onde repertórios tradicionais e contemporâneos atraem novas gerações. A África lembra que já junta dramaturgia, canto, dança e música há milênios e a América Latina chega como um grande mercado em ascensão.  

Evidentemente, essas diferenças também aparecem nos formatos de gestão e de financiamento, que não funcionam da mesma maneira para todos os teatros e países. Entre as discussões, uma delas se destacou: honrar a herança da ópera é também honrar os teatros que ousaram, em tempos passados, dar chance a novos compositores e a temas difíceis para a época.

Assim como qualquer outra manifestação cultural da atualidade, a ópera é também atravessada neste momento por pautas de gênero, raça e meio ambiente, que atualmente são transversais ao conjunto social. Se as pautas identitárias parecem já estar caminhando a passos largos, vencendo as dificuldades iniciais de compreensão e garantido cada vez mais seu espaço em todos os teatros e produções, os painéis do fórum mostraram que as questões ambientais ainda não foram totalmente compreendidas e que precisamos trazê-las com urgência para o centro do palco. Clima e meio ambiente serão temas fundamentais nas próximas décadas em qualquer país e para todas as atividades sociais e econômicas.

Estando à frente de um festival de ópera que acontece em plena Floresta Amazônica há mais de duas décadas, me lembrei de uma reivindicação importante dos povos originários da região: “Não falem de nós sem nós”. Foi a partir desta percepção tão pertinente que apresentei minhas falas sobre a diversidade, inclusão social, profissionalização, oportunidades de mobilidade social, criação de postos de trabalho, promoção do turismo regional e diálogo com a educação promovidos pelo Festival Amazonas de Ópera ao longo de seus 25 anos de vida.

Esses dados justificam a existência e as atividades de um teatro histórico de ópera em uma cidade amazônica no século XXI e nos apontam novos caminhos para o desenvolvimento econômico e social, que apostam e investem em atividades capazes de preservar a floresta e de gerar empregos e renda para além do extrativismo ou da indústria tradicional. 

Neste sentido, a economia criativa surge como um farol para os novos tempos. Não podemos mudar o passado, mas podemos projetar o futuro e utilizar o potencial da cultura como vetor de desenvolvimento sustentável. Isso depende do alcance da visão de nossos governantes e gestores públicos e também da nossa mobilização e organização conjunta como setor. Encontrar nossos pares mundiais e discutir nossas questões muito nos fortalece neste sentido.

O Brasil levou ao fórum a maior delegação entre os países da América Latina e contou com o apoio da Funarte (Fundação Nacional de Artes), o que mostra um novo entendimento sobre o setor. Temos que ocupar cada vez mais espaço neste mercado que movimenta bilhões de dólares pelo mundo. Daqui a quatro anos, nos encontraremos novamente, dessa vez no Japão, um país asiático, o que evidencia a ascensão do gênero no mundo inteiro e não deixa dúvida de que a ópera é a manifestação artística do século 21. 

*Flávia Furtado é diretora-presidente do Fundo do Festival Amazonas de Ópera, diretora da Vlaanderen Produções Culturais e membro da diretoria do Fórum Brasileiro de Ópera, Dança e Música de Concerto. Esteve no Fórum Mundial da Ópera como delegada oficial do evento

Discussões do Fórum Mundial da Ópera reuniram profissionais de todos os continentes [Divulgação]
Discussões do Fórum Mundial da Ópera reuniram profissionais de todos os continentes [Divulgação]

 

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