Theatro Municipal do Rio celebra Puccini com montagem de ‘Il Trittico’

por Luciana Medeiros 14/07/2024

O número três tem sido associado à espiritualidade e às religiões: Pai, Filho e Espírito Santo no cristianismo; Buda, Darma e Sanga no budismo; Brahma, Vishnu e Shiva no hinduísmo; Ísis, Osíris e Hórus dos egípcios. É o “número perfeito” dos chineses, a trindade da maçonaria; Zeus/Júpiter (Olimpo), Poseidon/Netuno (mares) e Hades/Plutão (mundo inferior) para a mitologia greco-romana. Dante escreveu sua Divina Comédia com três personagens principais, Dante (o homem), Beatriz (a fé) e Virgílio (a razão). São 3 livros de 33 cantos cada um.

Giacomo Puccini, que morreu há cem anos, estreou em 1918 no Metropolitan de Nova York sua ópera “tripla”, Il Trittico, com Claudia Muzio no elenco e elogios da crítica. E o Theatro Municipal do Rio de Janeiro faz voltar ao seu palco, nesse mês de julho, a obra de Puccini em nova produção, 29 anos depois da última vez que a apresentou. São cinco récitas a partir do dia 17 de julho, após uma pré-estreia no domingo, dia 14, aniversário do teatro carioca. A regência é de Carlos Vieu, maestro argentino de sólida carreira – atualmente dirige o Teatro Argentino de La Plata.

A sombria Il Tabarro, a intrigante Suor Angelica e a divertida Gianni Scchichi sugerem, para alguns, a triplicidade da estrutura do pós-vida cristão: o inferno no assassinato em Tabarro, o pecado e a remissão em Angelica, o céu das risadas em Schichi. “Bem, as três linhas finais de Gianni Schichi fazem referência a Dante”, lembra o diretor cênico Pablo Maritano, que dirige Il Trittico pela primeira vez e faz com essa produção sua estreia no Municipal do Rio. "Digam-me, senhores, / se o dinheiro do Buoso / poderia ter destino melhor do que esse? / Por essa bizarrice, eles me chutaram para o inferno... / e que assim seja; / mas com a permissão do grande pai Dante,/ se você se divertiu esta noite, / conceda-me...o fator atenuante!" E Schicchi é personagem da Divina Comédia: Dante Alighieri colocou os seus inimigos políticos e pessoais no Inferno e, entre os desafetos do poeta, estava Schicchi, cidadão de Florença.

Maritano enfatiza “três histórias completamente diferentes” na composição das três peças. “Tabarro é um grand guignol francês típico, quase uma crônica policial, com três personagens desesperados se encontrando em momento infeliz; Suor Angelica, genialmente, um thriller de suspense num convento; e Gianni Schicchi, uma grande homenagem à comédia operística tradicional, em que reúne os vilões de Rossini e Mozart.” 

O diretor decidiu ambientar as peças no século XX, em três momentos separados por décadas: 1920, 1940 e 1970, em abordagem naturalista. “Puccini originalmente coloca Il Tabarro em sua própria época e retrodata Suor Angélica para o século XVI ou XVII, numa liberdade poética total; Gianni Schicchi se passa no século XIII.” Cenários e figurinos estão a cargo de Desirée Bastos. “O cenário é uma caixa versátil, em que uma parede muda tudo”, adianta Maritano. 

São dois elencos, com destaques da cena lírica nacional, como Eiko Senda, Edinéia de Oliveira, Marcelo Ferreira, Vinícius Atique e Ludmila Bauerfeldt. “Trabalho com os cantores nas duas primeiras peças no diapasão do naturalismo, em que se pensa nas origens dos personagens, motivações, a projeção do universo psicológico”, conta Maritano. “Já na comédia, o mecanismo é situacional. Ensaiamos separadamente e foi muito curioso ver o primeiro ensaio em que todos estavam presentes – uma surpresa enorme dos elencos assistindo às óperas das quais não participam.”

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Eiko Senda como Angelica na produção carioca de 'Suor Angelica' [Divulgação]
Eiko Senda como Angelica na produção carioca de 'Suor Angelica' [Divulgação]

 

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A ópera Il Trittico de Puccini foi um espetáculo desigual no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Pontos altos como a presença de Eiko Senda, Enrique Bravo , Guilherme Moreira e Ludmilla Bauerfeldt em excelentes performances, e a regência de Carlos Vieu, demonstram o engajamento com a ópera desses intérpretes. Por outro lado, a direção de cena conturbada e circense do argentino Pablo Maritano, assinalem-se as presenças inadequadas de Tatiana Carlos ( com voz desigual e desafinação acentuada), Paulo Mandarino, Mere Oliveira, Murilo Neves, Andressa Inácio, Fernanda Schleder, Cabele Faria, Marcelo Ferreira e Flávia Fernandes com apresentações muito aquém do mínimo necessário em personagens tão expressivas do grande compositor Giacomo Puccini. Num nível mínimo razoável, pontuaram Lara Cavalcanti, Ednéia de Oliveira, Loren Vandal, Geilson Santos, Leonardo Thieze, Ciro D'Araujo (Maestro Spinelloccio e Amantino di Nicolao ); Patrick Oliveira e Cícero Pires.
Cenários paupérrimos e figurinos, desviados de suas épocas, são de mau gosto, de Desirée Bastos. O espetáculo resultou fraco e desequilibrado.
Marco Antônio Seta.

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