Volume 9

por Redação CONCERTO 07/07/2022

Vol 9

Camargo Guarnieri: Choros vol. 2 / Flor de Tremembé
Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo – Osesp
Roberto Tibiriçá
– clarinete  
Ovanir Buosi – viola  
Horácio Schaefer – regente  
Matias de Oliveira Pinto – violoncelo  
Olga Kopylova – piano  

Choros para violoncelo, clarinete, viola e piano

O nacionalismo musical de Camargo Guarnieri nunca foi um fim em si mesmo. Ele se inscrevia em uma escrita musical profundamente inventiva. A orquestração, a estrutura, o diálogo entre instrumentos, tudo isso confirma a percepção de que ele foi um dos grandes nomes da música do século XX. E o segundo volume de seus Choros, em gravação da Osesp, mostram os motivos. O repertório traz os Choros para violoncelo, clarinete, viola e piano (gravados por quatro grandes solistas: Olga Kopylova, Ovanir Buosi, Horacio Schaefer, todos músicos da Osesp, e o violoncelista Matias de Oliveira Pinto). Para cada instrumento, a escrita assume novo caráter, explorando justamente como pode se dar a combinação entre solista e orquestra. No primeiro volume, a Osesp foi regida por Isaac Karabtchevsky. Neste álbum, por outro regente profundo conhecedor da música brasileira, Roberto Tibiriçá. Como bônus, Flores de Tremembé, peça dos anos 1940 para 15 solistas e percussão. A sensação é uma só: quanto mais se ouve Guarnieri, maior o fascínio por uma personalidade musical única.

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Vol 9
[Reprodução]

Camargo Guarnieri (1907–1993) Choros • 2

Este é o segundo volume da primeira gravação integral dos Choros de Mozart Camargo Guarnieri (1907-1993), com o Choro para Clarinete e Orquestra (1956), o Choro para Viola e Orquestra (1975), o Choro para Violoncelo e Orquestra (1961) e o Choro para Piano e Orquestra (1956). Como o compositor explicou diversas vezes, o termo “choro” não evoca diretamente o gênero de música instrumental popular, surgido no Brasil e consolidado no final do século XIX. Guarnieri pretendeu que esse termo fosse uma espécie de expressão brasileira do gênero “concerto”, provavelmente referindo-se ao diálogo entre solista e orquestra em uma ambientação musical que, muitas vezes, sugere a paisagem sonora dos sertões, dos cerrados, das festas e folguedos que caracterizam o sentimento de “brasilidade”. Os quatro Choros têm características formais em comum: todos são divididos em três movimentos – ou em três partes, como o Choro para Clarinete, estruturado em um único movimento tripartido. Grosso modo, os primeiros movimentos são mais “racionais”, com grande densidade cromática e ênfase no desenvolvimento motívico, onde as melodias germinam a partir de uma pequena célula musical, burilada em diversas cores e combinações instrumentais – essa aliás, é uma das características de Guarnieri mais apreciadas por Mário de Andrade, seu mentor desde 1928, amizade e orientações iniciadas alguns anos depois que o então jovem músico veio morar em São Paulo (em 1923), deixando para trás sua cidade natal, Tietê. Os segundos movimentos são introspectivos e sentimentais, batizados com expressões características como “calmo e triste”, ou simplesmente “calmo”, ou ainda “lento e nostálgico” ou “nostálgico”. Como os títulos deixam entrever, a delicadeza e nostalgia que emanam dessas peças lentas evocam estados de espírito que se manifestam especialmente quando ficamos algum tempo longe de casa, de nosso lugar no mundo. Talvez por isso, a estrutura psicológica dos choros de Guarnieri reserva uma grande “festa” para o movimento final, como se representasse um reencontro imaginário entre o artista e os sentimentos mais profundos de sua nacionalidade; os finales de Guarnieri invariavelmente evocam a gestualidade da dança, do baião, do maracatu, da embolada, pontuada pela marcação calorosa da percussão e mudanças métricas que dão aos intérpretes espaço para mostrar uma alegria que transcende as imensas dificuldades técnicas presentes nessas partituras. zer que as peças em que solam o clarinete, o piano e o violoncelo guardam alguns elementos em comum, notadamente com relação a sua estrutura harmônica e formal. São obras que a célebre pianista e uma das principais intérpretes guarnierianas, Laís de Souza Brasil (em um estudo sobre as obras para piano e orquestra, organizado pelo musicólogo Flavio Silva no opulento volume Camargo Guarnieri: o Tempo e a Música, 2001), classificou como pertencentes ao “segundo estágio” criativo de Guarnieri, um período de maturidade iniciado em 1946, em que o compositor visitou todos os gêneros musicais, dominou a orquestra, expandiu sua técnica e firmou sua personalidade. Nessas obras vemos o convívio entre harmonias quartais e triádicas, que se esparramam em uma escrita contrapontística sempre elegante e inventiva. Em contraposição, o Choro para Viola e Orquestra se insere no universo entrevisto no “terceiro estágio” criativo iniciado pela Seresta para Piano e Orquestra (1965) e no Choro para Flauta e Orquestra de Câmara (1972), ambos registrados no primeiro volume desta coleção; nessa época o compositor atinge uma expressão mais sublimada, deixando o fluxo de suas ideias ir além das convenções tonais – às vezes até com alusão ao método dodecafônico. A outra pérola desse álbum, a saborosa Flor de Tremembé (1937), foi uma peça dedicada à segunda esposa de Guarnieri, Anita Queiroz de Almeida e Silva, nascida em Tremembé, na região do Vale do Paraíba, interior do estado de São Paulo. Essa obra tem muitas características encontradas no choro popular tradicional; seu tema inicial em Mi menor, tocado pelo fagote com apoio de reco-reco e chocalho, evoca a um só tempo duas obras icônicas do grande Villa-Lobos: a harmonia inicial do singelo Choros nº 1 para violão e o solo de contrafagote com marcação rítmica de caracaxá, que abre o grandioso Choros nº 8. A partitura de Flor de Tremembé consiste em um conjunto inusitado de 15 instrumentos solistas: flauta, clarinete, fagote, sax barítono, trompa, trompete, trombone, cavaquinho, harpa, piano, violino I, violino II, viola, violoncelo e piano; a percussão inclui quatro instrumentos: chocalho, recoreco, agogô e cuíca. Essa peça pertence ao “primeiro estágio” criativo de Guarnieri, e foi escrita um pouco antes de sua primeira viagem a Paris em 1938. Paulo de Tarso Salles Paulo de Tarso Salles é professor de Teoria Musical na USP, Coordenador do Simpósio Villa-Lobos (USP) e editor da Revista Música (USP). Autor de Aberturas e Impasses: o Pós-Moderno na Música e seus Reflexos no Brasil – 1970-1980 (ed. Unesp, 2005), Villa-Lobos: Processos Composicionais (ed. Unicamp, 2009) e Os Quartetos de Cordas de Villa-Lobos: Forma e Função (Edusp, 2018).
Paulo de Tarso Salles

Ovanir Buosi
Principal clarinet of the São Paulo Symphony Orchestra since 1997, Ovanir Buosi began his studies at the age of 12 with Luis Afonso Montanha. Having graduated from São Paulo State University (UNESP), where he was taught by Sérgio Burgani, he continued his studies with Michael Collins at the Royal College of Music in London. As well as winning the Weril Wind Prize, he has received awards in the OSESP Young Soloists Competition, the Rádio MEC performers competition, and the tenth edition of the Prêmio Eldorado de Música. He is a dedicated chamber musician and his discography includes a recording of works for wind quintet by composers of North and South America as a member of Quinteto Zephyros, and the album Retrato das Américas with pianist Horácio Gouveia. Buosi is on the staff at the OSESP Music Academy, teaches the Alexander Technique, and is regularly invited to perform and teach at festivals around Brazil. He is a Buffet Crampon and Vandoren artist.

Horácio Schaefer
Principal viola of the São Paulo Symphony Orchestra since 1998, Horácio Schaefer began his musical education in São Paulo and completed his studies with Max Rostal in Germany. While there, he became a member of the Deutsche Bachsolisten chamber orchestra, performed with the Frankfurt Radio Symphony, and was appointed principal viola of the Essen Philharmonic. He has taught in the music department of São Paulo University (USP) and at the School of Music and Fine Arts of the State of Paraná (Curitiba). Between 1995 and 1998 he was principal viola of the orchestra of the Municipal Theatre in São Paulo.

Matias de Oliveira Pinto
Cellist Matias de Oliveira Pinto began his musical education in his native city of São Paulo. In 1979, while still studying with Zigmunt Kubala, he himself took up a teaching post at the School of Music and Fine Arts of the State of Paraná (Curitiba). The following year he travelled to Berlin, having been awarded a scholarship by the Berliner Philharmoniker’s Karajan Academy. He also studied at the Hochschule der Künste Berlin and the Franz Liszt Academy in Budapest. A highly sought-after pedagogue, he teaches cello at the Universität der Künste Berlin and the Musikhochschule Münster. He is artistic director of the Ouro Branco Festival (Brazil), Cellofest (Chile) and Verden Festival (Germany). He has appeared as soloist and chamber musician in the world’s most prestigious concert halls, and has made recordings for Kreuzberg Records, Bella Musica and Hungaroton.

Olga Kopylova
Pianist with the São Paulo Symphony Orchestra (OSESP) since 1999, Olga Kopylova was born in Uzbekistan and studied at the Uspensky School of Music in Tashkent and the Moscow State Tchaikovsky Conservatory. Her solo album Estrela da Manhã (Loja Clássicos, 2006) features works by Prokofiev, Rachmaninov, Medtner and Scriabin. As a soloist, she has performed with, among others, the Campinas Symphony Orchestra, Curitiba Chamber Orchestra, North State Symphony (California) and OSESP, with which she has recorded two albums. She also teaches at the OSESP Music Academy. In 2021, she released three albums on the Azul Music label: Miniatures: The Music of Cécile Chaminade, Beethoven: Piano Sonatas Nos. 3 and 16 and Mozart: Sonatas for Piano and Violin, Vol. 1.

São Paulo Symphony Orchestra (Osesp)
Founded in 1954, the orchestra has been run by the Osesp Foundation since 2005. Thierry Fischer has been principal conductor and music director since 2020, succeeding Marin Alsop (2012–19). In 2016, the orchestra performed at major European festivals, and in 2019 toured China and Hong Kong. In the same year it launched Carnegie Hall’s All Together: A Global Ode to Joy project, performing Beethoven’s Ninth Symphony with a new Portuguese translation of the Ode to Joy. In 2018, its recording of the symphonies of Villa-Lobos (Naxos 8.506039), conducted by Isaac Karabtchevsky, won CONCERTO magazine’s Grand Prize and the Prêmio da Música Brasileira.

Roberto Tibiriçá
Born in São Paulo, Roberto Tibiriçá was taught by Guiomar Novaes, Magda Tagliaferro, Dinorah de Carvalho, Nelson Freire and Gilberto Tinetti. He also worked with Eleazar de Carvalho over a period of 18 years, after winning two consecutive editions of the OSESP Young Conductors Competition. Tibiriçá was appointed assistant conductor of Lisbon’s Teatro Nacional de São Carlos, going on to conduct the Brazilian Symphony Orchestra between 1994 and 1998. From 2000 to 2004, he was artistic director and principal conductor of the Petrobras Symphony Orchestra (OPPM) and between 2005 and 2011 served as artistic director of the Baccarelli Institute’s Heliópolis Symphony in São Paulo. In 2010, he became principal conductor of the Minas Gerais Symphony Orchestra, a role he retained until 2013. He has also been principal conductor and artistic director of the Campinas Symphony Orchestra, São Bernardo do Campo Philharmonic Orchestra and Sodre Symphony Orchestra (Montevideo). Tibiriçá is a member of the Academia Brasileira de Música and an honorary member of Brazil’s Academia Nacional de Música. In August 2020, he conducted the São Paulo Symphony Orchestra in the world premiere performance of João Guilherme Ripper’s monodrama Cartas Portuguesas.

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