O Cultura Artística voltou!

por João Luiz Sampaio 05/08/2024

Foram dezesseis anos – e eles não passaram rápido. Desde que foi consumido por um incêndio em 2008, o Teatro Cultura Artística nunca deixou de ser uma ausência sentida. A Rua Nestor Pestana tornou-se caminho, não mais destino. Passar por ali dava saudades, preocupação, antecipação – a depender do momento em que as obras se encontravam, lidando com mudanças no projeto, burocracias, a busca por verbas e outros desafios inerentes à construção de um novo teatro.

Mas na tarde de sábado, dia 3, o Cultura Artística voltou, com o primeiro de dois concertos de pré-abertura, para convidados e trabalhadores que atuaram nas obras e suas famílias (o segundo ocorreu no domingo). Foi um final de tarde especial, com presença da ministra da Cultura Margareth Menezes e autoridades dos governos municipal e estadual – sabe-se lá se gostaram da defesa da Lei Rouanet feita pela ministra, que tinha um argumento palpável em mãos: sem ela, não haveria novo Cultura Artística.

Para a abertura do teatro, a entidade optou por um simbolismo: a Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo interpretou o mesmo programa da inauguração do prédio original, em 1950. De Camargo Guarnieri, foram apresentadas a Dança brasileira, Encantamento e Serra do rola moça; de Villa-Lobos, Tarde Azul (a Canção do Amor de A Floresta do Amazonas) e as Bachianas brasileiras nº 8. Roberto Minczuk regeu e Carolina Faria foi a solista.

A acústica da sala passou com louvor pelo primeiro teste com público (outros, fechados, haviam sido feitos na semana passada com a Sinfônica Heliópolis). Cabe uma ressalva: o tamanho da orquestra e o repertório apresentado no final de semana fazem todo sentido pelo simbolismo que representaram, mas não são aqueles para os quais o novo teatro foi construído, tendo em vista orquestras de proporção clássica e a música de câmara. Mas, também por isso, a primeira e positiva impressão do concerto de sábado nos faz imaginar com expectativa os resultados que terão as apresentações da Filarmônica de Câmara Alemã de Bremen, no final de agosto, ou os recitais do barítono Mathias Goerne, em setembro – sim, amantes do canto: o novo Cultura Artística gosta da voz.

Planos

O projeto do  teatro sofreu mudanças ao longo dos últimos dezesseis anos. A opção pela música de câmara é a mais vistosa delas, preenche uma demanda central na cena clássica paulistana, mas não é a única. Criar uma nova sede acompanhou – ou acelerou – uma reflexão maior da entidade sobre o papel de um teatro dedicado a concertos em uma cidade como São Paulo. 

Diretor executivo da Cultura Artística, Federico Lohmann falou sobre isso em entrevista a Amanda Queirós, publicada na edição de agosto da Revista CONCERTO (leia aqui; acesso exclusivo para assinantes). Nos planos, além das séries de concertos internacionais, estão o investimento em música nova; na sala como foco de circulação e discussão de ideias; no apoio a jovens artistas; no desenvolvimento e ampliação dos projetos pedagógicos; na diversificação de repertório; e na relação com outras instituições artísticas do centro da cidade, trabalhando em sua revitalização – esse, talvez, o plano mais difícil de colocar em prática em uma cidade que parece ter abandonado de vez a região.

É hora, portanto, de celebrar a volta do Cultura Artística – e também de acompanhar como o teatro vai se inserir na cena musical brasileira e na cidade em que está localizada. São tempos estimulantes o que temos à nossa frente.

Leia também

CRÍTICA Ira Levin e Rodrigo Esteves garimpam revelações preciosas na dobradinha Busoni/Puccini, por Márvio dos Anjos
CRÍTICA O ‘Concerto da paz’ da Sinfônica de Campinas no Teatro Castro Mendes, por Jorge Coli
OPINIÃO Retrato do artista: alcides lanza, por João Marcos Coelho
OUVINTE CRÍTICO Tudandot e Gianni Schicchi [Theatro São Pedro]
 

Concerto de inauguração do novo Teatro Cultura Artística [Revista CONCERTO
Concerto de inauguração do novo Teatro Cultura Artística [Revista CONCERTO]

 

Curtir

Comentários

Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não refletem a opinião da Revista CONCERTO.

É preciso estar logado para comentar. Clique aqui para fazer seu login gratuito.