O pianista Hercules Gomes foi o solista; apresentação lembrou mês da consciência negra
SÃO PAULO (SP) – João Carlos Rocha nasceu em Santos, há 39 anos. Ele é bacharel em regência pela Unicamp (2013), fez seu mestrado na Alemanha e depois doutorou-se pela Universidade de Kentucky, nos Estados Unidos, onde reside até hoje. Durante a sua formação, participou de masterclasses com maestros como Daisuske Soga, Nicolas Pasquet, Roberto Tibiriçá, Neil Thomson e Isaac Karabtchevsky, e em 2012 foi um dos jovens maestros selecionados para o Laboratório de regência da Filarmônica de Minas Gerias, ministrado por Fábio Mechetti. Além de regente, João Rocha também se formou compositor, inspirado e orientado inicialmente, ainda nos anos 2000, por seu conterrâneo santista Gilberto Mendes.
Neste mês, João Rocha veio ao Brasil para um acontecimento especial: ele apresentou no sábado, dia 11 de novembro, regendo a Orquestra Sinfônica de USP, o seu Concerto para piano e orquestra, em estreia mundial. O solista, a quem a obra é dedicada, foi o pianista Hercules Gomes.
O Concerto para piano tem cerca de 20 minutos de duração e está estruturada em 3 movimentos. A idioma é tonal e a escrita, fluente. Os primeiros compassos, com fortes marcações rítmicas, abrem caminho para uma composição diversificada, que demonstra uma hábil e criativa utilização dos recursos orquestrais. No primeiro movimento, entre passagens orquestrais ou em diálogo com o piano, o compositor abre espaço para solos de piano de certo acento jazzístico. Em contraste, o segundo movimento se inicia com notas longas e o solista explorando a região aguda do piano, para depois dar espaço às cordas em passagens líricas. O clima é de uma certa serenidade, mas perturbada por intervenções da percussão. O terceiro movimento recupera andamento e ritmo, com o piano aparecendo em escalas e frases sincopadas. A obra termina em uma suspensão, criando um interessante efeito. O solista Hercules Gomes, ótimo como sempre, tocou com convicção e musicalidade, em perfeita sintonia com o espírito da obra.
O público que encheu o Anfiteatro Camargo Guarnieri aplaudiu entusiasmado. Hercules Gomes voltou ao palco e ofereceu um emocionante bis, uma delicada valsa de sua autoria, Platônica, de linda melodia e sensível fraseado (se você ainda não conhece esse artista especial e grande intérprete da música brasileira para piano, clique aqui para ver no YouTube o recital que ele deu na Sala São Paulo em novembro do ano passado).
O concerto da Osusp sob regência de João Rocha iniciou-se, na realidade, com uma obra de Gilberto Mendes (1922-2016), o Ponteio, escrito em sua fase nacionalista, em 1955. É uma obra curta, bem inusitada para quem conhece a criação posterior do grande compositor.
Para encerrar, Rocha conduziu a Osusp com elegância e muita propriedade na interpretação da Sinfonia nº 3, Escocesa, do alemão Felix Mendelssohn (1809-1847). Iniciada em 1829, durante uma viagem do compositor à Escócia, acabou sendo terminada apenas em 1842. Ainda que no scherzo do segundo movimento haja passagens de caráter folclórico talvez escocês, a obra é muito própria da escrita de Mendelssohn e da criação daquele período do início do Romantismo. A Osusp ofereceu uma bonita e equilibrada execução.
Além da boa música, o concerto da Osusp, programado no âmbito do mês da Consciência Negra, teve outra característica bem pouco comum: o maestro-compositor João Rocha assim como o pianista Hercules Gomes são negros. Ainda que raras, que bom que em nosso meio também haja iniciativas que promovam uma maior diversidade racial.
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Opinião Hercules Gomes, pianeiros e pianistas, cultura viva, por Nelson Rubens Kunze
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Comentários
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Parabéns Hercules por ser um…
Parabéns Hercules por ser um grande pianista brasileiro!