“Os tempos são difíceis, mas vamos retornar”, diz nova presidente do Municipal do Rio

por Luciana Medeiros 11/02/2021

O Theatro Municipal do Rio entra em 2021 com nova presidente, Clara Paulino, vinda da presidência do Museu da Imagem e do Som, cuja nomeação foi anunciada no dia 1º de fevereiro. Na prática, 2021 também marca a estreia de Ira Levin como diretor artístico de uma temporada completa do palco carioca – ele substituiu André Heller-Lopes no fim de agosto do ano passado. Levin é um regente de grande experiência e já atuou como diretor de diversas instituições de música, ópera e balé. Clara, ao contrário, vem de outra área, a de patrimônio e museus.

Aos 38 anos, a mineira de São Lourenço criada no Rio desde os cinco anos de idade enfrenta um desafio duplo: gerir uma casa de grande visibilidade e extrema complexidade, num momento de poucos recursos para a cultura; e fazer tudo isso em meio a uma pandemia que não mostra sinais de arrefecimento, mesmo com a chegada da vacina.

“Minha formação é na área de História e trabalhei principalmente com museus e patrimônio”, conta Clara ao Site CONCERTO em conversa por videoconferência. “Mas administrei um centro cultural do interior do Rio, em Quissamã, e vivi a experiência à frente de uma fundação estadual por dois anos.” No MIS carioca, Clara se dedicou à “reconstrução”, diz. “Há uma percepção errônea de que o MIS está fechado, porque as obras da nova sede estão paradas. Mas puxei pela programação cultural, pelos projetos de catalogação e acessibilidade.”

Clara Paulino, nova presidente da Fundação Theatro Municipal do Rio de Janeiro [Gui Maia/SECEC-RJ/Divulgação]
Clara Paulino, nova presidente da Fundação Theatro Municipal do Rio de Janeiro [Gui Maia/SECEC-RJ/Divulgação]

O convite para presidir o Municipal veio “no susto”, revela. Mas ela encontra ligações com sua área de origem: “Por mais que seja um equipamento ligado às artes performáticas, é uma memória viva. O acervo é importantíssimo, já fui às centrais técnicas da Gamboa e de Inhaúma, há muito o que fazer.” Ela também conta que é espectadora fiel. Lembranças principais? “Uma Carmen. O Quebra-Nozes.”

A complexidade da administração do Theatro Municipal do Rio envolve o sempre delicado relacionamento com os corpos artísticos. “Já me reuni com as associações e o sindicato. Os artistas do Municipal passaram por muitas coisas ruins, estão fragilizados pelos déficits de pessoal, pelas ameaças de transformação em organização social. Estamos conversando e tentando mapear todas as questões, agravadas ainda por esse momento da pandemia. A equipe daqui é fantástica. Percorri palco e bastidores com a diretora operacional, estamos prevendo limpeza do ar-condicionado, troca do linóleo do balé, pedi avaliação dos pianos, vamos avançar num projeto em andamento de manutenção dos vitrais”, lista Clara. “Estou com olheiras! Em dez dias, não parei.” 

Na área da programação, a bola foi passada para Ira Levin. “O maestro já tem uma temporada pensada, com plano de retomada dos espetáculos presenciais no segundo semestre, se isso for possível. Só vamos reabrir em total segurança. Enquanto isso, planejo voltar com as visitas guiadas, talvez uma exposição com o maravilhoso material do Centro de Documentação. Também queremos retomar as aulas da Escola de Danças Maria Olenewa.”

Para custear a montagem e a execução da programação 2021 a fundação contará com dotação direta e captação de patrocínios – o terceiro pilar de financiamento das atividades, a bilheteria, não é uma realidade no momento. 

“Em março haverá liberação de dinheiro do Estado para manutenção e operacionalização”, pontua Clara. “Prevemos uma média de R$ 3 milhões para atender ao dia a dia da casa e também aos espetáculos. Temos ainda que finalizar a contrapartida dos patrocínios da Vale e da Petrobras de 2020, negociando já uma continuidade.” O contraste é grande entre a dotação 2021 e a de anos anteriores – como em 2001, quando a verba de manutenção e custeio chegou a R$ 12 milhões. E ela ainda lembra que pode haver contingenciamento. Tempos difíceis.
“Mas quero crer que vamos conseguir dar muita visibilidade aos artistas da casa”, diz. “Pensamos em anunciar a programação gradualmente e retomar da mesma forma a presença do público. É o maior desejo de todos aqui.”

Programação 2021

A temporada de 2021 do Municipal do Rio “já está pronta”, avisa Ira Levin, “mas ainda não sabemos como será realizada, em função da pandemia”. Ele adianta algumas das atrações previstas, com exclusividade para o Site CONCERTO. 

“Abriremos a temporada em abril e queremos voltar às apresentações com público na sala assim que pudermos, ainda no final do primeiro semestre se possível”, revela o diretor. “Se tudo correr muito bem, faremos uma ópera completa em dezembro, diversos títulos líricos em concerto e outros espetáculos de balé e concertos, incluindo missas de Haydn e a música de compositores brasileiros do período colonial.” Até junho, a temporada deve seguir on-line, com apresentações sempre pré-gravadas.

Em abril, estão previstas as gravações de três concertos, os dois primeiros com um repertório que inclui o Concerto para piano nº 14 de Mozart (com Levin como regente e solista) e a estreia de um novo arranjo para orquestra de cordas feito pelo maestro do Quarteto A morte e a donzela, de Schubert. O terceiro será uma homenagem do Quinteto de Metais da Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal do Rio a Daniel Havens e aos antigos professores e instrumentistas da casa.

A programação de concertos tem ainda, em maio, Emmanuele Baldini regendo Haydn (Sinfonia nº 49) e Mozart (Serenata Haffner) com orquestra de câmara; em junho, Levin e Daniel Guedes em programa com Schubert (Rondó em lá maior), Guerra-Peixe (Concertino) e Beethoven (Septeto); e, em julho, Claudio Cruz regendo Mozart (Divertimento) e Bartók (Divertimento).

Na ópera, já há espetáculos importantes confirmados. O Municipal idealizou um Tríptico feminino, com Armida abbandonata, de Händel; Arianna em Naxos, de Haydn; e o Pierrot lunaire, de Schoenberg. A regência será de Priscila Bomfim e a direção, de Julianna Santos. O elenco tem nomes como a soprano Eliane Coelho e as mezzo sopranos Carolina Faria e Denise de Freitas. O lançamento das montagens nas plataformas digitais acontece entre junho e agosto e o objetivo é, em 2022, encená-las novamente com a presença do público.

Em agosto, Levin comanda uma dobradinha formada pelo quarto ato do Rigoletto, de Verdi, e Il tabarro, de Puccini, em versão semi-encenada e com participação da soprano Marly Montoni, do tenor Eric Herrero e do barítono Leonardo Neiva, entre outros. E, em setembro, está previsto o balé O lago dos cisnes

O maestro Ira Levin, diretor artístico do Theatro Municipal do Rio de Janeiro [Divulgação]
O maestro Ira Levin, diretor artístico do Theatro Municipal do Rio de Janeiro [Divulgação]

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