Morreu na quinta-feira, dia 31 de julho, o diretor teatral e dramaturgo norte-americano Robert Wilson. Ele estava com 83 anos. Segundo informações da família, ele sofria de uma doença “grave e breve” e morreu em sua casa no estado de Nova York.
Wilson foi nome central do teatro dos últimos 50 anos e desenvolveu importante trabalho com a ópera, desde a década de 1970, quando colaborou com o compositor Philip Glass na criação de Einstein on the Beach. A partir dali, dirigiu montagens antológicas do repertório – em 2012, assinou uma antológica produção de Macbeth, de Verdi, estreada no Theatro Municipal de São Paulo.
Nascido no Texas, em 1941, Wilson construiu um estilo próprio, no qual as cores, as luzes e o gesto tinham importância central na construção da interpretação. Suas cenas eram criadas como quadros nos quais as personagens moviam-se de forma estilizada, como figuras fora do mundo, nas palavras da crítica teatral Maria Eugenia de Menezes.
Isso estava ligado à origem de sua relação com a criação, que se deu por meio das artes visuais. “Minha formação foi principalmente em artes visuais, arquitetura e pintura, então costumo trazer um aspecto visual muito forte para o trabalho em termos de luz, em termos de gestos, às vezes cenário, adereços, mobiliário, escultura. Sempre penso que o que vemos é o que vemos e o que ouvimos é o que ouvimos, e o que vemos deve ser tão importante quanto o que ouvimos”, disse em uma entrevista.
“Muitas vezes, no teatro, o que vemos é secundário ao que ouvimos, e achamos que a coisa mais importante no teatro é o texto, o livro, a palavra. Em uma ópera, é a música, mas as duas principais maneiras pelas quais nos comunicamos uns com os outros são através dos nossos olhos e dos nossos ouvidos. Então, tento fazer com que o aspecto visual não seja necessariamente uma decoração, ou simplesmente um suporte, mas pode ser paralelo, pode ser tão importante. É um parceiro igual e pode reforçar o que ouvimos, sem ter que ilustrar ou decorar.”
![Cena da produção de 'Macbeth', de Verdi, no Theatro Municipal de São Paulo [Divulgação/Roger Sassaki/robertwilson.com]](/sites/default/files/inline-images/w-macbeth.jpg)
Com isso, suas produções estabeleciam uma relação original entre espaço e tempo, como ele própria definia. “Para mim, é tudo arquitetura. É construção, tempo e espaço, como sustentar essa linha de atenção. Às vezes, pode ser algo contraditório e direcionar mais atenção para o espaço, e às vezes não. São decisões estéticas tomadas em uma construção de tempo e espaço, então às vezes se pode ver, talvez, um movimento no palco que é mais lento ou em andamentos diferentes da música. Ou é um ritmo interno da música; às vezes pode ser mais rápido e às vezes pode estar exatamente no andamento da música”.
“Para mim, é chato se todo o caminhar e todos os movimentos estiverem exatamente no andamento da música, então às vezes há alguém caminhando mais devagar, alguém mais rápido, alguém com a música. Isso cria um trabalho mais denso, mais complexo. Também se relaciona mais com a energia do público. Você percebe que algumas pessoas estão em ritmos mentais diferentes na plateia. Dentro de uma casa, há vibrações mentais muito diferentes do público. E o palco é como uma bateria, então você pode configurar diferentes energias nessa bateria que talvez se relacionem com todo o público.”
No início dos anos 2000, ele assinou uma produção do Anel do nibelungo, de Wagner, em Zurique e em Paris, que se tornou símbolo da forma como se aproximava do repertório. “Como já havia feito em Parsifal e Pelléas et Mélisande de Debussy, rejeitando o que chama de ilustração decorativa da narrativa, ele usa austeridade e autocontrole para criar um espaço no qual a música e o libreto podem respirar livremente”, escreveu Alan Riding no New York Times. “A iluminação é a estrela: inúmeros tons de cor refletem a mudança de humor da trama, enquanto holofotes isolam o rosto ou as mãos das figuras em silhueta. Os deuses, incluindo Wotan, não parecem menos sobrenaturais. Eles se movem com gestos quase robóticos.”
“Acima de tudo, tento não impor minha interpretação à obra para deixar espaço para questionamentos”, explicou o diretor na época. “O teatro costuma ser muito ditatorial. Um escritor, diretor ou designer tem uma ideia e insiste nela. Isso não deixa espaço para trocas, para outras ideias.” Defendendo a sobriedade de sua abordagem ao Anel, ele acrescentou: “Na minha opinião, com uma obra já carregada de emoções avassaladoras, uma produção igualmente comovente e emocionante não faz sentido.”
Ao jornal Texas Monthly, em 2020, Wilson tentou resumir o seu trabalho. “Meu teatro é formal. É diferente da maneira como a maioria dos diretores trabalha. É outro mundo que eu crio; não é um mundo que você vê onde quer que esteja, seja no seu escritório, na rua ou em casa. Este é um mundo diferente. É um mundo criado para um palco. A luz é diferente. O espaço é diferente. A maneira como você anda é diferente. A maneira como você canta é diferente da maneira como você canta no chuveiro.”
“O teatro desempenha uma função única na sociedade. É um fórum onde as pessoas se reúnem e podem compartilhar algo juntas por um breve período de tempo. A arte tem a possibilidade de nos unir. E a razão pela qual fazemos teatro, a razão pela qual o chamamos de peça (play) – é porque estamos jogando (playing). Estamos nos divertindo. E se você não se diverte atuando, então não faça.”
![O diretor e dramaturgo Robert Wilson [Divulgação/Yorgos Kaplanidis/robertwilson.com]](/sites/default/files/inline-images/w-robert_wilsonKAP1384.jpg)
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