Camila Fresca, jornalista e pesquisadora
“É redundante dizer que esse foi um ano difícil. Surpreendente no pior dos sentidos. Pior ainda é pensar que, em finais de dezembro, enquanto esse texto é escrito, nenhuma ação concreta se apresenta no horizonte, no sentido de mitigar o estrago da pandemia e recuperar a atividade econômica e cultural do país.
Com teatros e instituições fechadas em março, no exato momento em que as temporadas se iniciavam, tudo ficou em suspenso. De breves adiamentos a remanejamentos, e finalmente de uma série de cancelamentos, foi feita essa não-temporada. A programação regular de concertos foi a que mais sofreu, mas algumas entidades foram aos poucos adaptando-se e trazendo para o mundo virtual parte de suas atividades, como a Filarmônica de Minas Gerais e a Sala Cecília Meireles, que chamaram atenção pela qualidade de suas transmissões, ou a Sinfônica de Santo André, pela criatividade da programação. Louvável também foi a atitude do Instituto Baccarelli, que radicalizou sua função primordial, apoiando a comunidade de Heliópolis e tornando sua sede um centro para recebimento e distribuição de produtos de primeira necessidade.
Na área dos festivais tivemos algumas boas iniciativas, que souberam compensar a falta do encontro presencial com engenho e uma participação sem fronteiras. Destaco nesse sentido o Fimuca (Festival Internacional de Música em Casa), o Festival Forrobodó/Unimúsica (UFRGS) e o 8º Festival de Música Erudita do Espírito Santo, cuja curadoria inspirada de Livia Sabag impressionou na escolha de obras e compositores.
Também foi tempo para reflexão, atualizando o meio erudito com debates que já se tornaram urgentes na sociedade, como a presença de mulheres e negros na programação de concertos. Nesse sentido, vale mencionar a série Osusp Debates e o Festival Ubuntu.
Alguns lançamentos de livros e CDs, pouco comentados em meio ao conturbado cenário, merecem ser lembrados, pois serão referências para músicos e estudiosos da música brasileira de hoje e de amanhã: a nova edição do Ensaio sobre música brasileira, de Mário de Andrade, organizado por Flávia Toni; a reedição do pioneiro disco Alberto Nepomuceno – canções, de Anna Maria Kieffer e Achille Picchi; e os lançamentos dedicados a obra de Claudio Santoro, cujo centenário foi comemorado em 2019.
Já no finalzinho do ano, uma iniciativa inesperada e emocionante: 16 pianistas tocando as 32 sonatas para piano de Beethoven pelas ruas de São Paulo, num domingo de sol e chuvisco, durante a Virada Cultural da cidade de São Paulo, em feliz iniciativa de Antonio Vaz Lemes.”
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