Pianista francês e solistas de São Paulo fazem recital de alto nível na temporada internacional da Tucca
Ontem, quarta-feira dia 3 de agosto, a temporada internacional da Tucca promoveu um concerto de música de câmara que reuniu o renomado pianista francês Jean-Yves Thibaudet ao São Paulo Chamber Soloists. Se Thibaudet dispensa apresentações – o virtuose já esteve outras vezes por aqui e é conhecido do público paulistano – vale a pena falar dos solistas de câmara de São Paulo. Trata-se de um grupo novo, formado por alguns dos melhores instrumentistas da cidade – a ideia partiu do spalla do Theatro Municipal de São Paulo Alejandro Aldana e do concertino da Osesp Matthew Thorpe –, que tem como proposta divulgar o repertório para uma formação variada de até 14 músicos. O conjunto estreou no ano passado e já se apresentou também no Festival de Música de Câmara do Sesc e no Festival de Inverno de Campos do Jordão. Sempre com excelente recepção.
No concerto de ontem, o São Paulo Chamber Soloists se apresentou como quarteto de cordas com Betina Stegmann (que também é primeiro violino do Quarteto de Cordas da Cidade de São Paulo), Matthew Thorpe, o violista Gabriel Marin e o violoncelista Rafael Cesário. E foi excelente!
Na música de câmara, um bom entrosamento musical depende de muitos fatores, e vai bem além da competência técnica de cada um dos instrumentistas. São timbres que devem ser amalgamados, concepções musicais que têm de ser harmonizadas, além de uma mesma compreensão artística da obra que está sendo executada. Normalmente, isso exige tempo e muito ensaio. Tanto mais impressionante o resultado alcançado no concerto de ontem, com um músico de fora e um quarteto de cordas estreante. Aqui, a individualidade de cada um dos instrumentistas concorreu para um todo sonoro muito equilibrado, de ricos matizes timbrísticos. E isso na privilegiada acústica da Sala São Paulo. Que maravilha!
A apresentação foi uma emocionante viagem pelo melhor (e mais bonito) do repertório romântico – o Quinteto com piano op. 44 de Robert Schumann (1810-1856) e o Quinteto com piano nº 2 opus 81 de Antonin Dvorak (1841-1904).
O quinteto de Schumann é de 1842, ano em que o compositor se dedicou intensamente à música de câmara compondo também os quartetos op.42, o quarteto com piano op. 47 e as peças de fantasia para trio de piano op. 88. O quinteto foi dedicada a Clara Schumann, que o estreou em concerto público em 1843, no Gewandhaus de Leipzig. Em quatro movimentos, a composição entrou para a história como uma das maiores joias camerísticas da música romântica. E é mesmo arrebatadoramente linda.
Tivemos ontem na Sala São Paulo uma interpretação à altura da importância que a obra carrega. Thibaudet ofereceu uma interpretação que soube balancear no grau exato a presença do piano com o discurso musical das cordas, em uma ótima integração. No mesmo nível, os músicos da São Paulo Chamber Soloists demonstraram profunda sinergia, de alta vibração, com afinação, articulações e dinâmicas bem cuidadas. Em um nível tão elevado, é difícil destacar momentos especiais – é uma partitura em que cada página traz uma emoção estética. No geral, e no melhor espírito da música de câmara, todos os músicos exibiram um raro senso de conjunto e executaram a obra com grande impacto artístico.
Seguiu-se o quinteto de Dvorak, outra obra-prima para esta formação. Escrito em 1887 (portanto mais de 40 anos após o de Schumann), também em quatro movimentos, ele já pertence a uma fase posterior do romantismo, com uma linguagem mais densa e, próprio de Dvorak, influências da música tradicional de sua Boêmia natal.
Ainda que muito boa e plena de sucesso, algumas diferenças em andamentos e sutis desequilíbrios de dinâmica fizeram com que a interpretação do quinteto de Dvorak não alcançasse o mesmo impressionante nível artístico da obra de Schumann. Ainda assim, foram lindos os diversos solos e intervenções musicais, da maestria de Thibaudet ao piano, passando pelo som aveludado de Gabriel Marin, pelos lindos fraseados do violoncelo de Rafael Cesário, pela concentração artística de Matthew Thorpe até chegar na qualidade do som quente e sensível de Betina Stegmann – música à flor da pele!
A cidade de São Paulo está acostumada com a visita de grandes artistas internacionais, como Jean-Yves Thibaudet. Já a São Paulo Chamber Soloists é uma grande novidade, que deve ser apoiada e festejada. Oxalá tenha longa vida e inspire outros músicos e mesmo instituições.
A temporada internacional de Tucca em 2022 segue ainda com variadas atrações do jazz à música clássica. Durante o segundo semestre se apresentam o trompetista cubano Arturo Sandoval, a pianista Valentina Lisitsa em um recital Chopin, o guitarrista Pat Metheny, um recital da orquestra de câmara norte-americana Sphinx Virtousi com o violinista Ricardo Herz e o trompetista Terence Blanchard com o E-Collective e o Turtle Island Quartet.
[Clique aqui para mais informações sobre a temporada internacional de Tucca.]
Leia também
Notícias Percussionista Andressa Daniella Santos vence Prêmio Eleazar de Carvalho
Notícias Osesp apresenta concertinos de Francisco Mignone na Sala São Paulo
Notícias Festival de Ópera de Pernambuco resgata 'A Compadecida', de José Siqueira
Crítica Jakub Józef Orlínski fascina plateia da Sala São Paulo em recital memorável, por Irineu Franco Perpetuo
É preciso estar logado para comentar. Clique aqui para fazer seu login gratuito.
Comentários
Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não refletem a opinião da Revista CONCERTO.