Retrospectiva 2020: Edna D’Oliveira

por Redação CONCERTO 28/12/2020

Edna D’Oliveira, soprano

“2020 será um ano marcado não só pela pandemia, pelo negacionismo e pelas consequências que o vírus trouxe para nós artistas brasileiros. Mas também será marcado pelas inéditas discussões e reflexões sobre o racismo, através de inúmeras lives, festivais e webinários que aconteceram pelo Brasil, a respeito não só dos fatos tristes que vieram à tona, dos movimentos Vidas Negras Importam, mas também das possibilidades da desconstrução dos arquétipos e estereótipos eurocentristas no mundo da ópera e da música de concerto. Emergiu a necessidade de criação de ações afirmativas para a visibilização dos cantores líricos negros que, historicamente, construíram a história da música erudita no Brasil. 

Ao relembrarmos a proibição de acesso dos escravos às escolas e a substituição da mão de obra musical negra por músicos brancos estrangeiros pela elite aristocrata, desde o período colonial brasileiro, podemos entender o abismo não só na educação formal do negro, mas também na sua formação musical. Relegados à miséria, perderam o direito de participação e realização do mercado musical erudito. Através do racismo institucionalizado, amparado pelas instituições públicas com leis duras e injustas, a população negra teve negado o seu acesso à educação e assim lhe foi tirado o ofício da música erudita, deixando-a para as manifestações populares. Dessa forma podemos compreender a razão de termos tão poucos representantes negros na ópera e na música de concerto no Brasil, e porque a diversidade racial na ópera ainda é combatida por uma parte da sociedade brasileira, que permanece nas estruturas do poder econômico, político e cultural, promovendo a continuidade do sistema colonial racista nas casas de ópera e de concerto. 

Tivemos avanços nas discussões a respeito da diversidade racial na ópera, e será vergonhoso para qualquer instituição não promover dentro das suas programações a visibilidade destes corpos negros eruditos cheios de talento espalhados pelo Brasil. Mas ainda temos instituições, maestros e diretores que se negam às discussões. A estes, cabe a lembrança eterna do negacionismo e a indiferença como trataram a igualdade de gênero e raça. 

Vidas negras importam, cantoras e cantores líricos negros importam e fazem diferença no colorido musical e harmônico da música erudita brasileira. Que em 2021 artistas, diretores e produtores saiam da sua cômoda posição de privilégio e se tornem verdadeiros aliados da luta anti-racista na ópera e na música de concerto do Brasil.”

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