Nascida em 1970 na cidade de Louisville, no estado norte-americano do Kentucky, Valerie Coleman começou sua história na música como flautista, antes de se dedicar à composição. Mas um elemento central na sua trajetória já estava presente desde cedo: a compreensão do fazer musical que está aliado ao contexto social e às questões de seu tempo.
Como instrumentista, ela fundou, há mais de 25 anos, o quinteto Imani Winds, com o qual realizou turnês em todo o mundo, apostando no repertório contemporâneo, na obra de compositoras e trabalhando em prol de maior espaço para músicos negros.
“Nosso trabalho sempre olhou para o repertório tradicional de música de câmara, mas desde cedo nos pareceu claro que era importante olhar obras recém-encomendadas de vozes que refletem acontecimentos históricos e os tempos em que vivemos”, explicou ela quando esteve no Brasil com o conjunto em 2019, no Festival Sesc de Música de Câmara.
Coleman também criou o conjunto Umana Womama. O nome faz um jogo com o termo “mãe” em Zulu, que é pronunciado aqui tanto no singular quanto no plural. E a proposta é que a experiência individual das integrantes seja o ponto de partida para a construção de programas e para a relação a ser estabelecida com o público.
A flauta tem, naturalmente, importância central no seu trabalho como criadora. Em Amazonia, peça para piano e flauta estreada no início de 2020, isso fica bastante claro. A obra é dedicada à floresta e Coleman a define como “um poema que descreve uma beleza natural que progressivamente vai sendo destruída, à medida que os aspectos sombrios da natureza humana interferem em sua vitalidade”.
A obra começa com o nascer do sol, com a flauta dialogando com elementos da música brasileira. Em seguida, uma melodia simples evoca o universo das crianças que brincam pela selva e nos rios. E então elementos sombrios começam a surgir, tomando a paisagem. O piano representa caçadores e mercenários e a flauta reage. Mas parece não haver saída e a música se encerra com a visão do fogo consumindo a floresta. “Achei importante recordar o que outrora foi uma maravilha natural, mas mostrar também o efeito da ganância do homem.”
Umoja
Uma de suas principais partituras, Umoja foi escrita como um coro para vozes femininas. O termo se refere à palavra "união" em Swahili. Coleman conta, em seu site, que o objetivo era reproduzir “um sentido de união tribal” por meio de um jogo de chamados e respostas particular às rodas de tambores encontradas em regiões da África. Em 2019, ela criou uma nova versão da peça, para orquestra, estreada pela Orquestra da Filadélfia e o maestro Yannick Nézet-Séguin.
“A versão orquestral traz uma expansão e sofisticação à melodia curta e doce que é a base da peça, começando com passagens etéreas que flutuam e mudam de um vibrafone para o violino solo. Aqui a melodia é um canto doce em sua forma mais simples, com uma reminiscência da música do estilo dos Apalaches. A partir daí, a melodia dança em todas as famílias de instrumentos, interrompida por pontos de vista dissonantes liderados pelas seções de metais e percussão, que representam o choque de injustiças, racismo e ódio. Texturas pontiagudas se transformam em agressivas troca entre sopros e percussão, antes de um retorno à melodia como um gentil lembrete de bondade e humanidade. Através do conjunto de metais tutti, a jornada termina com um ousado apelo à unidade que remonta ao hino original”, explica a compositora.
“Umoja viu a criação de muitas versões (há também uma para quinteto de sopros), que são como irmãs umas das outras, semelhantes em muitos aspectos, mas cada um com uma voz única que é informada pelo sempre evoluindo a criatividade e a perspectiva.”
Roteiro
Umoja, em sua versão orquestral, será apresentada pela Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo nos concertos dos dias 16, 17 e 18 de maio, sob regência do maestro Thierry Fischer, em um programa que tem ainda a Sinfonia alpina, de Strauss. Veja mais informações aqui.
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