Além da Sétima sinfonia de Mayer, programa contou com o Prelúdio da ópera Lohengrin, de Wagner, e com o Réquiem, de Mozart
Foi muito bom o concerto da Osesp desta semana, que teve regência do maestro franco-suíço Joseph Bastian (titular da Orquestra Sinfônica de Munique e principal regente convidado da Orquestra Dijon Bourgogne, na França, e da Asian Youth Orchestra). Assisti na quinta-feira, dia 1º de maio.
O programa começou com o Prelúdio do Ato 1 de Lohengrin, ópera de Richard Wagner, já deslocando a audiência para a música do século XIX. A orquestra soou bem e equilibrada, conduzida com cuidado por Bastian, que logrou construir organicamente a sensível viagem do santo gral das etéreas alturas dos céus ao seu destino terreno.
Seguiu-se a Sinfonia nº 7 em fá menor da alemã Emilie Mayer, composta em 1856. A primeira menção a Emilie Mayer no Site CONCERTO é de 2022, quando a Orquestra Sinfônica do Espírito Santo, em uma celebração ao Dia das Mulheres, apresentou a sua Abertura Fausto sob regência de Cinthia Alireti. Já desde o começo dos anos 2000, contudo, especialmente na Alemanha, pesquisadores e músicos vem redescobrindo a obra dessa que foi seguramente uma das mais importantes compositoras do século XIX.
Emilie Mayer nasceu em 1812, em Friedland, no norte da Alemanha, e faleceu em 1883, em Berlim (viveu, portanto, no mesmo período de Richard Wagner, que nasceu em 1813 e morreu no mesmo ano de 1883). Aos dois anos perdeu a mãe e, em 1841, o pai, um abastado apotecário que lhe deixou uma pequena fortuna. Só então, aos 29 anos, Mayer viu-se desimpedida para se dedicar integralmente à música. Mudou-se para Stettin (atualmente Szczecin, na Polônia), onde estudou composição com Carl Loewe. Mais tarde, seguiu para Berlim e em pouco tempo se destacou como compositora sinfônica, passando a ter suas obras executadas em importantes salas de concerto.

Emilie Mayer foi uma figura excepcional em sua época, não apenas por sua criação e produtividade, mas também pela ousadia de construir uma carreira como compositora profissional em um ambiente fortemente dominado por homens.
Seu catálogo é vasto e inclui oito sinfonias, várias aberturas orquestrais, sonatas para piano, música de câmara e Lieder. Os pesquisadores afirmam que suas sinfonias, compostas entre as décadas de 1840 e 1860, demonstram um domínio absoluto da forma e uma linguagem pessoal, lírica e expressiva, que ecoa Beethoven e Schumann.
Foi assim também que ouvi a sua Sétima sinfonia, executada pela Osesp. Seu início é enérgico e vigoroso, mas logo aparecem motivos melódicos costurados em uma sofisticada malha sonora própria do início do romantismo. Estruturada em quatro movimentos, a obra não deixa a dever nada à produção dos grandes mestres que foram seus contemporâneos.
Sem dúvida, a qualidade da obra também acabou realçado pela boa interpretação da Osesp dirigida por Bastian. Passagens rítmicas foram executadas com precisão e soaram bonitos os solos que compõem a partitura.
Ouvindo a obra e considerando o reconhecimento que Emilie Mayer teve em vida – foi premiada, teve suas obras publicadas e executadas e exerceu cargos públicos – é mesmo incompreensível “o ocaso em que afundou após a morte”, como escreve Laura Rónai nas notas do programa do concerto da Osesp...
O concerto se encerrou com uma emocionante apresentação do Réquiem de Mozart, obra-prima do gênio austríaco. Escrito em 1791, pouco antes de sua morte, o Réquiem é cercado de mistérios e lendas, mas transcende detalhes biográficos ao tocar na essência do sublime.
Na apresentação da Sala São Paulo, o primeiro destaque cabe ao Coro da Osesp, que, com articulações cuidadas e consistente densidade vocal, fez uma performance muito boa. Igualmente bom foi o desempenho do elenco de solistas, muito equilibrado: a soprano Gabriella Pace, a mezzo Ana Lucia Benedetti, o tenor Rodrigo del Pozo e o barítono Leonardo Neiva combinaram claras linhas vocais com seus respectivos lindos timbres. Em conjunto com uma concentrada Osesp e sob a condução sensível e competente de Joseph Bastian, o Réquiem teve uma interpretação de alto nível e de grande impacto artístico e emocional.
São Paulo pode se orgulhar de ter uma ótima orquestra sinfônica, a Osesp, que apresenta regularmente o grande repertório histórico e universal, o que já é especial e muito bom. Quando a programação ainda traz obras raras ou novas descobertas, como a sinfonia de Emilie Mayer, o concerto se destaca do convencional. Concertos bem concebidos, além de toda a força emocional transformadora, podem iluminar o passado e renovar a experiência auditiva do público.
A apresentação do dia 2 de maio foi gravada, assista abaixo:

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