Apresentação lotada e de alto nível demonstra a repercussão e a qualidade que o projeto sinfônico criado e mantido pelo estado de Minas Gerais alcançou
“A música sinfônica é um dos mais elevados legados da humanidade, uma expressão artística que transcende tempos e fronteiras. Em Minas Gerais, terra de cultura, arte e erudição, esse legado encontra um de seus templos mais sublimes: a Sala Minas Gerais. Inaugurada em fevereiro de 2015, a sala não é apenas um espaço de concertos, mas um patrimônio da arte mundial, uma joia arquitetônica e acústica que projeta Minas Gerais no cenário global da música clássica. [...] Além de ser a casa da Filarmônica de Minas Gerais, a sala tornou-se um polo de atração turística e cultural, recebendo artistas de todo o Brasil e do exterior.”
Após a crise enfrentada no ano passado – quando o governo do estado de Minas Gerais cogitou retirar a Filarmônica da Sala Minas Gerais –, é uma enorme alegria ler essas palavras do secretário de Cultura e Turismo de Minas Gerais, Leônidas Oliveira, no programa do concerto comemorativo dos 10 anos da Sala Minas Gerais. Ele tem absoluta razão!
A Sala Minas Gerais é resultado de uma política pública visionária, inspirada nos mesmos ideais expressos pelo secretário Leônidas. Erguida com recursos da estatal mineira Codemig para ser a sede da espetacular Filarmônica de Minas Gerais – criada oito anos antes –, a Sala Minas Gerais é gerida por uma instituição de direito privado sem fins lucrativos, o Instituto Cultural Filarmônica, em uma moderna e eficiente parceria público-privada no modelo de organizações sociais (nos mesmos moldes da Sala São Paulo e da Osesp, na capital paulista). A Sala Minas Gerais é o máximo! Ela coloca Belo Horizonte entre as cidades que mantêm um espaço exclusivamente voltado à música clássica, ela coloca Minas Gerais entre os estados que promovem “um dos mais elevados legados da humanidade, uma expressão artística que transcende tempos e fronteiras”.
Viajei a Belo Horizonte na sexta-feira, 21 de fevereiro, para assistir à comemoração dos 10 anos da Sala Minas Gerais. Assim como na noite anterior, a Filarmônica de Minas Gerais, o Coro da Osesp, os solistas Gabriella Pace, Edineia Oliveira, Matheus Pompeu e Licio Bruno, sob regência de Fabio Mechetti, apresentaram a Nona sinfonia de Beethoven. A sala estava lotada e o clima era de festa, com o público feliz e orgulhoso.
Estreada há 200 anos, mais precisamente em 1824, a Nona de Beethoven, especialmente seu tema coral do quarto movimento, é provavelmente o maior símbolo da música clássica no mundo. O poema de Schiller, Ode à alegria, que serve de texto, exalta a alegria como uma força divina, capaz de unir a humanidade, superar as divisões sociais e promover a fraternidade – uma mensagem de tolerância e paz mais atual do que nunca (não à toa, a Nona foi tocada quando caiu o muro de Berlim, e a Ode à alegria tornou-se o hino oficial da União Europeia).
A apresentação da Nona sinfonia pela Filarmônica de Minas Gerais, com lotação esgotada e execução de alto nível, demonstrou a repercussão e a qualidade que esse projeto sinfônico alcançou. A performance foi excelente e o quarto movimento, o coral, destacou-se como o ponto culminante de uma interpretação no todo muito consistente. Foi emocionante a entrada do barítono Licio Bruno com o “O Freunde” – Ó, amigos! Não esses sons! Vamos entoar cantos mais agradáveis e mais cheios de alegria –, com voz bem impostada e ressoante, após o tenso embate do início do movimento.
Gabriella Pace, Edineia Oliveira, Matheus Pompeu e Licio Bruno formaram um quarteto vocal muito equilibrado, integrando-se organicamente ao ótimo Coro da Osesp. Em seu solo, o tenor Matheus Pompeu exibiu um timbre bonito e luminoso, confirmando o sucesso que tem alcançado nos palcos europeus.
Foi muito bem também a Filarmônica de Minas Gerais conduzida com a habitual elegância e competência por seu titular, Fábio Mechetti, que regeu de cor. Sua interpretação privilegiou andamentos mais lentos do que estamos acostumados a ouvir, especialmente no segundo movimento – o maestro contou depois que seguiu a indicação de metrônomo que Beethoven anotou na partitura, que é menos rápida do que a prática comum. Esse enfoque conferiu maior densidade e um possível acréscimo de páthos emocional, embora tenha reduzido um pouco a dinâmica rítmica e o brilho instrumental.
Ao fim e ao cabo, foi uma comemoração em grande estilo de um projeto moderno e de excelência, que contribui para reforçar e difundir uma mensagem profundamente humanista. Parafraseando Schiller, todos os homens se tornam irmãos onde a suave asa da música repousa.
E, para terminar como comecei, volto ao texto do secretário Leônidas Oliveira: “Que esta sala siga sendo um santuário da arte, uma referência mundial e um símbolo do compromisso de Minas Gerais com a cultura e a excelência musical”.
Vida longa à Sala Minas Gerais! Vida longa à Filarmônica de Minas Gerais!
[Nelson Rubens Kunze viajou a Belo Horizonte e assistiu ao concerto comemorativo dos 10 anos da Sala Minas Gerais a convite do Instituto Cultural Filarmônica.]
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