Retrospectiva 2020: João Marcos Coelho

por Redação CONCERTO 28/12/2020

João Marcos Coelho, jornalista e crítico musical

“Foi um ano atípico, claro, por causa da pandemia, que transformou em pó todas as programações e concertos presenciais no planeta. Num momento desses é que se percebe quais instituições e músicos possuem uma mínima vinculação com os públicos que sempre os prestigiaram em tempos normais.

Não quero transformar este curto texto em um muro de lamentações, mas que as coisas andaram muito mal, isso é incontestável. Sobretudo no reino das orquestras sinfônicas, em tese as instituições que teriam melhores condições de oferecer alternativas e se adaptarem à nova realidade. Afinal, nenhum profissional, músico ou não, com vínculo empregatício nas orquestras brasileiras sofreu redução de salário ou foi demitido por causa da pandemia. Nem por isso sentiram-se obrigados a colocar a criatividade para funcionar.

Houve, porém, quem não tenha se acomodado e revolucionou a cena musical brasileira com iniciativas inéditas e pensadas rigorosamente para o novo meio disponível para fazer a sua música chegar às pessoas. Ao menos duas orquestras – a e Santo André e a Orquestra de Câmara da USP – esbanjaram criatividade e qualidade de invenção. Conceberam, realizaram e colocaram imediatamente no Youtube em acesso universal seus admiráveis projetos. 

Na primeira, o maestro Abel Rocha fez oito encomendas a compositores brasileiros de obras pensadas para serem estreadas no meio digital; em seguida, “Trilogia trancafiada”, na qual seus músicos filmaram seu dia-a-dia igualzinho ao nosso e mostraram música que de fato nos toca, porque nos torna iguais a todos no padecimento deste terrível isolamento; e, finalmente, há pouco mais de um mês, com uma engenhosa reinvenção do Guarani de Carlos Gomes em sete minutos.

Já a Ocam do Departamento de Música da USP encontrou em seu maestro Gil Jardim a cabeça pensante de alguns projetos igualmente admiráveis. O mais recente, “Inumeráveis”, foi o que mais me tocou. Já tem mais e 23 mil visualizações no Youtube e reúne a poesia e cordel de Bráulio Bessa com a música de Chico César e o arranjo sinfônico-coral de Gil Jardim, que a transformaram provavelmente na obra de arte que todo brasileiro precisa ver para se conscientizar de que não somos números. 

Remeto quem não os assistiu a vê-los no Youtube. Só por essas duas iniciativas 2020 valeu a pena.” 

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[Revista CONCERTO / Anthony Kunze]
[Revista CONCERTO / Anthony Kunze]

 

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