NOCTURNE: MUSIC FOR HARP
Alessia Luise – harpa
Lançamento Brilliant Classics.
Importado. R$ 89
Noturnos compõem quase um gênero à parte no repertório musical. Em diferentes épocas, mas em especial no século XIX, compositores tentaram reproduzir em música a paisagem noturna, seus mistérios, encantos e segredos que se tornam ainda mais especiais quando recriados pela sonoridade da harpa. E, neste álbum, foi o ponto de partida para o trabalho de Alessia Luise. Professora atuante, ela confessa que sua escolha pelo instrumento foi “amor à primeira vista”. Ao longo de sua trajetória, ela já tocou ao lado de artistas como Gidon Kremer e Mario Brunello, e sob regência de maestros como Zubin Mehta, Daniel Harding, Isaac Karabtchevsky e John Neschling. Finalizou estudos de composição justamente para fazer transcrições para harpa solo ou como solista de orquestra de importantes obras do repertório. É uma revelação ouvir, por exemplo, sua leitura para a Sonata ao luar, de Beethoven, ou para uma seleção de noturnos de Chopin. De Brahms, ela toca a Sonata nº 3. E então, Debussy: Suite Bergamasque, Noturno e Les soirs illuminés par l´ardeur du charbon, três obras nas quais o caráter etéreo parece sintetizar nossa relação com a noite e o significado sensível que há sobre nós. A harpa é um dos instrumentos mais antigos que existem e sua sonoridade mágica se adequa magnificamente para esse repertório.
WOLF-FERRARI
Integral das aberturas e intermezzi
Oviedo Filarmonia
Friedrich Haider – regente
Lançamento Naxos. Importado.
R$ 98,10
No final do século XIX, a ópera italiana passou por um momento de renovação. Após a dominância de Giuseppe Verdi até os anos 1880 e a tentativa de mudança pelos compositores do chamado Verismo, Puccini impôs-se como nome central do gênero. E depois? Esse momento de busca de novas possibilidades trouxe alguns nomes ao centro do palco. E o principal deles talvez seja o de Ermanno Wolf-Ferrari. Curiosamente, ele entrou para o repertório por conta de Sly, tragédia de cortes veristas que foi cantada por nomes como o tenor José Carreras. Mas a maior parte de seu trabalho no gênero operístico se deu com comédias. São obras nas quais ele homenageia a tradição da ópera-bufa italiana, que remonta a Giovanni Battista Pergolesi e passa pelos autores do bel canto. E, ao mesmo tempo, em que a revê à luz de seu tempo. Basta ouvir a abertura de Il segreto di Susanna ou então a de Il campiello, que estão entre as obras gravadas aqui pela Oviedo Filarmonia junto ao maestro Friedrich Haider, especialista no compositor: do ritmo alucinante às mais belas e delicadas melodias, fica claro o senso teatral de Wolf-Ferrari, que merece ser resgatado como importante voz no cenário da ópera do século XX.
HORN AND PIANO: A COR BASSE RECITAL
Teunis van der Zwart – trompa
Alexander Melnikov – piano
Lançamento Harmonia Mundi. Importado. R$ 150,60
O “cor basse” é a trompa focada nos registros mais graves. E para ela, como acompanhamento do piano, o compositor Giovanni Punto, contemporâneo de Beethoven, escreveu dezesseis concertos. Seu nome não entrou para o repertório, mas isso deve acontecer agora que Teunis van der Zwart e Alexander Melnikov gravaram o Concerto nº 1, ao lado de outra peça de Beethoven, Danzi e Ferdinand Ries. Van der Zwart é conhecido pelo trabalho junto a alguns dos principais conjuntos da música historicamente informada, como a Akademie für Alte Musik Berlin ou a Freiburger Barockorchester, enquanto Melnikov, parceiro de câmara de músicos como a violinista alemã Isabelle Faust, tem atuado na leitura histórica do repertório do século XVIII e XIX. O duo forma, assim, uma combinação ideal, e as interpretações nos oferecem um olhar sobre um momento importante da história da música, sem ignorar o que cada um dos compositores tem de mais pessoal e idiomático. O resultado é um álbum repleto de descobertas musicais. Destaca a Revista Grammophone na sua edição de março de 2022: “Van der Zwart explora os contrastes entre registros e entre notas fechadas e abertas, tão vividamente como raramente ouvido.”
MUZIO CLEMENTI: PIANO JEWELS
Capriccios – Tocatta – La chasse
Rodolfo Leone – piano
Lançamento Naxos. Importado.
R$ 98,10
O compositor e pianista italiano Muzio Clementi (1752-1832) costuma aparecer nas narrativas sobre a vida musical do final do século XVIII, começo do século XIX. Tocou com Mozart e seu desempenho ao piano impactaria nomes importantes, como Beethoven. Clementi foi um grande desenvolvedor da moderna técnica pianística. Sua influência nos pianistas provou ser duradoura, seja através de suas composições, livros de estudo ou pela introdução de novos níveis de virtuosismo. O público agora tem a chance de conhecer sua relação com o piano por meio do registro das suas principais obras para o instrumento, algumas inéditas, uma iniciativa do pianista Rodolfo Leone. O italiano venceu em 2017, com 24 anos, a International Beethoven Piano Competition, de Viena, e desde então já foi chamado pela imprensa austríaca de um “filósofo do som”, por suas leituras profundas. Aqui, ele abre o disco com a Tocatta, tão admirada por Mozart. E, nos Capriccios, é capaz de nos revelar a transformação pela qual passou a música na Viena daquele tempo: os primeiros estão próximos do estilo de Haydn, enquanto os últimos já carregam uma escrita próxima a Beethoven. Completa o álbum La chasse, uma vigorosa sonata para piano.
J.S. BACH & BEYOND
A well-tempered Conversation
Julien Libeer – piano
Lançamento Harmonia Mundi. Importado. 2 CDs. R$ 189,20
E se compreendêssemos a história da música ocidental como uma grande e rica conversa entre compositores? A pergunta traz múltiplas respostas – e uma delas é o álbum do pianista Julien Libeer, que durante cinco anos foi assistente da pianista Maria João Pires na Queen Elisabeth Music Chapel, na Bélgica. Ele aproveitou o aniversário de 300 anos da publicação do primeiro livro de O cravo bem temperado, de Bach, e gravou prelúdios e fugas em tonalidade maior ao lado de peças de diferentes épocas, nas tonalidades menores correspondentes. Parece complicado ou misterioso, mas o que Libeer faz soa, na verdade, fascinante. Por meio de seu toque, ouvimos Bach ao lado de Rachmaninov (o terceiro dos Dez prelúdios), Shostakovich (o 22º dos 24 prelúdios e fugas), Schönberg (Pequenas peças para piano), além de Mozart, Chopin, Beethoven, Brahms ou Max Reger. É, como diz o pianista, “um jogo de espelhos, em que a própria condição humana reflete a si própria a partir da obra de grandes gênios da música.”
FOUR VISIONS OF FRANCE
Obras de Saint-Saëns, Fauré, Honegger e Lalo
Daniel Müller-Schott – violoncelo
Orquestra Sinfônica Alemã em Berlim
Alexandre Bloch – regente
Lançamento Orfeo. Importado. R$ 159,40
Se a música nos revela muito a respeito de uma cultura, é preciso reconhecer ao mesmo tempo que essa revelação carrega várias facetas diferentes. Processo estimulante, é esse o ponto de partida do álbum do violoncelista Daniel Müller-Schott, nome-chave de seu instrumento na cena musical de nosso tempo, gravado ao lado da Orquestra Sinfônica Alemã em Berlim e do maestro Alexandre Bloch. O músico escolheu quatro compositores que, a seu ver, são representativos da música francesa, evidenciando em suas interpretações o que têm de próximo e, principalmente, de diferente. De Saint-Saëns, ele toca o Concerto nº 1 e uma versão para violoncelo e orquestra do belíssimo Romance op. 36. De Fauré, uma obra canônica do repertório, a Élégie, também em arranjo para cello e orquestra. E, de Honegger e Lalo, seus concertos para violoncelo. A transparência em Saint-Saëns, a riqueza das cores em Lalo, o impacto quase visual da paisagem sonora de Honegger, a delicadeza de Fauré: com a sensibilidade de Müller-Schott, quatro mundos se revelam perante o ouvinte, todos evocando aspectos que fazem a música francesa tão rica e fascinante.
TODA SEMANA DE 22
Vários artistas
Lançamento Selo Sesc. Nacional. Embalagem com 4 CDs e 1 livro
de capa dura. R$ 100.
O centenário da Semana de Arte Moderna de 1922 levou a uma série de reflexões a respeito do grupo de artistas que, no começo do século XX, propôs uma renovação da arte brasileira. Mas não há reflexão sem informação. O que foi dito ao longo da semana? O que foi tocado? Por quem? Para responder a essa pergunta, Claudia Toni, Flávia Toni e Camila Fresca se dedicaram à extensa pesquisa, que deu origem ao projeto Toda Semana. Nele, estão reproduzidas as principais palestras apresentadas no Theatro Municipal de São Paulo e informações sobre todas as peças musicais interpretadas. Mais do que isso: um grupo de grandes artistas foi convocado para gravar as obras, caso do pianista Cristian Budu, do violinista Cláudio Cruz ou do Quarteto Carlos Gomes. O resultado é excepcional e, por que não dizer, histórico. Um trabalho primoroso, um dos principais legados que as celebrações pelo centenário da Semana de Arte Moderna nos deixa.
SONG OF THE BLACK SWAN
Cláudio Cruz – violino
Marcelo Bratke – piano
Lançamento Azul Music. Digital. Disponível apenas por streaming.
Não parece haver limites para a musicalidade de Cláudio Cruz. Como maestro, fez da Orquestra Jovem do Estado um dos principais conjuntos sinfônicos do país. Como camerista, atua à frente do Quarteto Carlos Gomes, sem deixar de lado o repertório para violino solo, além de se juntar a artistas em trios, duos, quintetos. Seria suficiente, mas é preciso lembrar ainda o trabalho de edição de partituras da música brasileira. E o mesmo podemos dizer sobre o pianista Marcelo Bratke: sua curiosidade pelo repertório, a busca por relações entre as artes e a atuação como comunicador fazem dele figura-chave da música brasileira atual. Não é difícil, portanto, imaginar o que acontece quando os dois se juntam. E Song of the black swan é prova da importância que diálogos musicais têm para os artistas. Na gravação, eles interpretam obras conhecidas de autores como Massenet (Meditação), Gluck (Dança dos espíritos abençoados) e Tchaikovsky (Andante do Quarteto de cordas op. 11 em arranjo de Fritz Kreisler). E obras brasileiras, de Mignone e Villa--Lobos, como o Canto do cisne negro, que dá nome ao álbum. São leituras tocantes e repletas de intensidade.
DIÁLOGOS
Heinz Karl Schwebel e
Ayrton Benck – trompetes
Lançamento independente. Digital. Disponível apenas por streaming.
Heinz Karl Schwebel e Ayrton Benck se conheceram nos anos 1980 durante uma edição do Curso Internacional de Verão de Brasília. Com o tempo, seguiram seus caminhos: Schwebel assumiu o posto de professor na Universidade Federal da Bahia, onde toca também na Osba; Benck foi dar aulas na Universidade Federal da Paraíba e integrar o Quinteto Brassil. Os dois, no entanto, se reencontraram para gravar obras para duo de trompetes e trompete solo. O resultado é o álbum Diálogos, nome que vem de uma peça do compositor francês Eugène Bozza e que é apenas uma das descobertas do repertório. É interessante, por exemplo, a leitura que fazem de Fanfarra para um novo teatro, de Stravinsky; de Concerto para dois trompetes de Erik Morales; ou então de Concertino clássico de Joseph Horowitz. O ponto alto, porém, é Valsa verde, de Lourenço da Fonseca Barbosa, mais conhecido como Capiba, um dos principais nomes da música brasileira no século XX. Aqui, em especial, Schwebel e Benck mostram a versatilidade de seus instrumentos, que nos transportam para um Brasil de outras épocas.
ENTRE BRUMAS E FÚRIAS
Quarteto Boulanger
Lançamento independente. Nacional. Preço a definir.
“Atentas às brumas que envolvem o futuro e às fúrias decorrentes da banalização da vida neste século XXI, as musicistas do Quarteto Boulanger encomendaram cinco peças a cinco compositoras brasileiras. Juntas, tornam visíveis e audíveis suas visões musicais e suas percepções sobre a época em que vivemos”, diz o texto de apresentação. A violinista Jovana Trifunovic, a violista Flávia Motta, a violoncelista Lina Radovanovic e a pianista Ayumi Shigeta, integrantes da Filarmônica de Minas Gerais, buscaram diferentes gerações para compor o repertório. De Marisa Rezende, tocam Pequenos gestos, focando o diálogo entre os instrumentos. Já Maria Helena Rosas Fernandes ofereceu ao grupo Celebração, em que incorpora elementos da cultura indígena. Silvia de Lucca, em Carm’in versos, persegue a revelação de lados ocultos da realidade. Em Caged Bird, Tatiana Catanzaro explora a ideia do aprisionamento. E Valéria Bonafé participa com Mãe-maré, uma reflexão musical sobre a maternidade e o cotidiano. Haverá recitais de lançamento dia 9, em Belo Horizonte, e dias 19 e 21 em São Paulo: veja no Roteiro Musical.
MÚSICA DE ESCRITURA
O maximalismo na obra musical de Flo Menezes
Flo Menezes – organizador
Edições Flopan. Livro digital. Download gratuito em
http://flomenezes.mus.br/flomenezes/index_flomenezes.html
Um novo livro reúne ensaios a respeito da obra do compositor Flo Menezes, que completa 60 anos em abril. Professor de composição e música eletroacústica da Unesp e diretor do Studio PANaroma da Unesp, Menezes é voz fundamental na criação musical brasileira. Música de escritura, que pode ser baixado gratuitamente, deve seu título às reflexões do compositor a respeito de seu trabalho. “Nos últimos tempos, tenho me perguntado, mais uma vez, acerca da essência de nosso fazer nas trilhas da composição. Ele pode ser e foi definido de diversas maneiras: música contemporânea, música de vanguarda, Música Nova (Neue Musik), Música Maximalista (meu termo desde 1983, quando, aos 21 anos, o introduzi em um concerto no Masp para definir minha própria poética musical), Música de Invenção (termo cunhado pelo grande poeta Augusto de Campos)...”, escreve na apresentação do livro. “Todos esses termos fazem sentido e procuram situar um fazer musical que toma distância da música de mercado, da música ‘popularesca’ (termo de Béla Bartók) ou popular: um fazer musical que ancora sua poética numa intertextualidade, por mais implícita que esta seja, que rebate seus feitos num longo decurso transgressivo – de um transgresso, não propriamente de um ‘progresso’ – da linguagem musical ao longo de séculos e encontra suas raízes no advento da escrita ou notação musical. Mas a escrita nasceu já de um anseio de escritura, e a isso, sim, dirigimos nosso foco. A escritura musical é, pois, o que motivara o nascimento da escrita musical para que, dela se valendo, pudesse ela mesma se desenvolver. Eis o que define, pois, o que realmente fazemos: por tal razão tenho ultimamente definido este fazer como Música de Escritura”, completa. Organizado por Flo Menezes, o livro traz ensaios de Sergio Kafejian, Leonardo Martinelli, Flávio Monteiro, Vladimir Safatle, Maurício Ayer, Daniel Barreiro, George Alveskog, Paola Baron, Willian Lentz, Fábio Scucuglia, Caio Tikaraishi Pierangeli, Raphael Domiciano, Helen Gallo, Gabriel Xavier, Leonardo Labrada, Tiago Gati e Victor Lacerda.